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Alarga a tua tenda

Alarga a tua tenda

By Agência ECCLESIA

«Alarga a tua tenda» é um podcast da Agência Ecclesia que nasce do caminho sinodal que a Igreja está a fazer. O objetivo é contar percursos e momentos de aproximação ou afastamento à fé, falar sobre espiritualidade, perguntas, certezas e incertezas. Queremos tatear, através de diferentes vidas, a forma como a Igreja se constrói e contar como se sonha a comunidade onde todos têm lugar. As conversas são conduzidas pela jornalista Lígia Silveira e publicadas integralmente neste podcast depois de emitidas no programa Ecclesia, na Antena 1, poucos minutos depois da meia-noite de quinta-feira.
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A fé, a pressão do futuro e a importância do Papa Francisco nos 18 anos de Maria Branco Machado

Alarga a tua tendaSep 14, 2023

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A fé, a pressão do futuro e a importância do Papa Francisco nos 18 anos de Maria Branco Machado

A fé, a pressão do futuro e a importância do Papa Francisco nos 18 anos de Maria Branco Machado

Maria Branco Machado está a iniciar os estudos em Ciências Biomédicas, na Universidade de Aveiro, e leva consigo, não a certeza de um percurso profissional, mas a leveza de se saber incapaz de controlar tudo. Para traz fica a pressão e a angústia que colocou em si própria, e também o ano que viveu na Roménia, onde encontrou «um balão de oxigénio» a fazer voluntariado. Quis dar-se espaço, conhecer mundo e pessoas diferentes que lhe alargaram o horizonte sobre Deus. No regresso, foi junto do Papa Francisco, na JMJ Lisboa 2023, que encontrou palavras de validação e companhia para as incertezas de vida da sua geração.

Sep 14, 202355:09
Os 75 países que Joana Bacelar Virgy conheceu e as «pessoas boas» que encontrou com desejos de paz

Os 75 países que Joana Bacelar Virgy conheceu e as «pessoas boas» que encontrou com desejos de paz

Joana Bacelar Virgy viajou por 75 países: rezou numa Mesquita por ocasião da Páscoa, na Tunísia, apanhou boleia no Uzbequistão e ficou em casa da tia de um rapaz que conheceu no avião, conheceu uma família no Líbano que sobrevivia com a plantação de droga e era do Hezbollah, viajou com uma iraniana que conhecia tudo da Europa, viveu um ano na Rússia, esteve em Israel e na Palestina onde conheceu pessoas zangadas entre si que nunca se conheceram, viveu com italianas na Alemanha, fez voluntariado na Suécia com jovens que não estudavam nem trabalhavam.

Com 29 anos, Joana entende que a sua missão de vida é juntar pessoas. O seu desejo é ir ao Afeganistão. Em todas as suas viagens foi em busca da vida real, quis saber onde os sapatos das pessoas assentam e em todos, conheceu o desejo de paz.

Aug 31, 202347:45
15 anos a contar «vidas felizes», com Sónia Neves

15 anos a contar «vidas felizes», com Sónia Neves

Com quase 15 anos de jornalismo, Sónia Neves, da Agência ECCLESIA, vai iniciar um projeto numa aldeia em Portugal, procurando privilegiar uma vida “com tempo e em família”.

Convidada a revisitar os muitos encontros que desde outubro de 2009 foi construindo no jornalismo, e o significado que estes trabalhos têm na sua vida de "mulher de fé", são "felizmente" muitos os encontros e as vidas que procurou entregar, quer nos programas de rádio da ECCLESIA, na Antena 1, em horário noturno ou a iniciar o dia "com alegria", mas também em muitos artigos escritos e programas de televisão que desenvolveu - sempre com a marca de procurar «vidas felizes».

Aug 24, 202357:47
«Servir quem não gosto, que não está nas minhas relações, que pensa diferente - esse é o verdadeiro acolhimento», e a missão de Catarina Pereira

«Servir quem não gosto, que não está nas minhas relações, que pensa diferente - esse é o verdadeiro acolhimento», e a missão de Catarina Pereira

Aos 12 anos, Catarina Pereira foi desafiada a ir embrulhar presentes destinados a crianças na Ceia de Natal da sua comunidade; aos 18 anos, quando passava na rua, uma criança de três anos que brincava com uma beata apanhada do chão deu à jovem a certeza de que o sue futuro só seria feliz se pudesse ser a trabalhar para ajudar essas pessoas. Hoje é assistente social no Projeto Barra, na paróquia de São Julião, em Oeiras e tem a certeza de que, as alturas em que falhou na sua vida, foi quando não acolheu e não se deu. Aos 26 anos, sabe que é a relação com as pessoas que faz a diferença: «Quando eles perceberem que eu não estou num pedestal, tal como eles não são inferiores apenas porque existe uma condição na sua vida que os levou a determinado caminho».


Aug 17, 202353:28
Os valores da música no grupo «Gen Verde» e a vocação de Sílvia Reis

Os valores da música no grupo «Gen Verde» e a vocação de Sílvia Reis

Sílvia Reis conheceu o Movimento dos Focolares aos 14 anos, numa altura em que procurava exigência e radicalidade. Na sua «rotina» cristã não encontrava coerência e a busca da verdade levou-a a Lopiano, em Itália, à cidadela fundada por Chiara Lubich, para que jovens e casais pudessem aprofundar a fé e obter formação.

O seu caminho ganhou o ritmo da bateria no grupo musical «Gen Verde»; hoje é atrás, nos bastidores, que confirma o quanto a música ultrapassa fronteiras, propõe valores e acompanha os jovens.

Aug 10, 202335:07
Os valores da música e a empatia que a língua portuguesa cria, com Carlota Pimenta

Os valores da música e a empatia que a língua portuguesa cria, com Carlota Pimenta

A língua portuguesa e a linguagem musical são dois mundos em que Carlota Pimenta cumpre com mestria, seja juntos do alunos, portugueses e estrangeiros que procuram aprofundar os estudos no português, seja com o violino que a acompanha desde nova.

Na sala de aula, na Universidade Católica Portuguesa, dialoga com diferentes culturas e pratica a empatia como forma de ensino junto de quem quer aprofundar a língua portuguesa; numa orquestra desenvolve o valor do silêncio e da espera, da paciência, do diálogo e humildade e a dar importância ao tempo presente – todos estes valores estarão consigo e presentes quando a Orquestra da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 interpretar o repertório para o Papa Francisco.


Jul 27, 202349:55
A união familiar no caminho de construção da JMJ Lisboa 2023, com Marta e Zarica Beja

A união familiar no caminho de construção da JMJ Lisboa 2023, com Marta e Zarica Beja

Quando a JMJ Lisboa 2023 foi anunciada Marta e Zarica Beja sabiam que teriam de participar. A disponibilidade e espírito de ajuda é uma marca desta família, assim como o constante desafio: umas vezes chega do lado dos filhos, a maioria chega pela energia contagiante da mãe Zarica que com facilidade constrói uma rede de pessoas igualmente disponíveis e solidárias. A certeza de que a JMJ Lisboa 2023 vai ser um acontecimento bom une ainda mais mãe e filha que contagiam em energia e positividade toda a equipa de organização.


Jul 20, 202346:35
A liberdade interior, a simplicidade de Deus e a vida religiosa no caminho de Adriana Abreu

A liberdade interior, a simplicidade de Deus e a vida religiosa no caminho de Adriana Abreu

A vida não decorre em linha reta e não faz mal. Adriana Abreu vai-se descobrindo nas curvas do caminho e diz que ainda bem que assim é, porque é importante criar espaço de liberdade interior para se deixar “desconstruir”, evitando que o «calendário de vida» seja uma escravidão. Foi por isso que no final do primeiro ano do curso de Medicina decidiu suspender o seu percurso para viver nove meses numa ordem contemplativa, pensando que o seu caminho seria realizado na oração. Enganou-se, mas não completamente. À contemplação quis juntar a ação e hoje é como aspirante na congregação Apresentação de Maria – Filhas de Maria Rivier que, com serenidade e verdade, vai caminhando, porque acredita que o lugar onde “se vai encontrar com Deus” é no serviço.


Jul 13, 202352:28
Quando a discrição e a generosidade se aliam para valorizar o bom e o belo, com António Fonseca

Quando a discrição e a generosidade se aliam para valorizar o bom e o belo, com António Fonseca

Foi numa composição da escola primária que António Fonseca disse primeiro querer ser «filmador» e desde então recorda-se de as brincadeiras serem todas em torno de programas de rádio e experimentar ser operador de câmara.

A certeza da comunicação na sua vida conduziu-o a participar em inúmeros projetos ligados à Igreja católica onde contribui sempre de forma discreta. O que seduz António Fonseca é a valorização das histórias bonitas, tantas vezes escondidas, que, tal como o bem não faz barulho, mas ajudam a dar esperança e inspiram quem se cruza com elas.

O seu objetivo é estar sempre disponível para que através dos seus dons, Deus possa passar por ele e para chegar a mais pessoas. Os caminhos e moradas são desconhecidos, mas António Fonseca acredita que há muitos frutos a colher pelo percurso, se mantivermos o olhar disponível.

«Os caminhos de fé são irregulares. Deus usa todos os meios para chegar aos seus filhos, não há caminhos melhores ou piores. Para mim é muito significativo na Igreja hoje: a casa de Deus tem muitas moradas e o caminho para lé chegar também. Eu experimentei isso».

«O meu pai faz um Cursilho de Cristandade, há um percurso de regresso à prática dominical e começa a dar catequese de adultos na paróquia. A minha mãe sempre nos apoiou e respeitou nos bastidores. Quando ela decidiu fazer a primeira comunhão e o crisma, já adulta e anos depois de eu e o meu irmão recebermos o Crisma, o meu pai foi o seu catequista para a preparação dos sacramentos. Hoje estão os dois inseridos na comunidade».

«Na realidade o meu percurso tem sido uma busca de fidelidade ao que Deus me vai pedindo: os projetos vão surgindo, por fidelidade e resposta que vou dando, gosto em poder fazer pontes entre várias sensibilidade e por me sentir chamado a ampliar as vidas bonitas e os testemunhos, que tantas vezes são feitos de forma discreta».

«Se terminasse hoje já teria valido a pena para mim, e para a Igreja em Portugal. Na minha secretária estão pessoas do México, Portugal, Brasil Itália, América que dão meses da sua vida para construir a JMJ, com um desejo autêntico que Jesus seja conhecido, o Papa seja acolhido e a mensagem de construção de um mundo novo seja efetiva. Isto é vitalizante e contagiante. Vejo isso a acontecer na Igreja e estes laços não acontecem de cima para baixo, mas ali se percebem porque já existem».


Jun 29, 202301:05:39
O vale de Chelas está a mudar com a generosidade dos jovens - Frei Tibério Zilio

O vale de Chelas está a mudar com a generosidade dos jovens - Frei Tibério Zilio

Frei Tibério Zilio, da Ordem dos Frades Menores Conventuais, diz que a esperança está a nascer entre os jovens nas paróquias no Vale de Chelas, em Lisboa, marcadas pela pobreza cultural e muito diversas mas onde a generosidade ajuda a congregar.

Há mais de 20 anos em Portugal e atual pároco nestas comunidades, o frade, natural de uma vila pequena perto de Pádua, percorre as ruas de Chelas proporcionando o encontro que acredita fará a diferença nas vidas de quem ali habita, mas também na sua – seguir hoje São Francisco de Assis significa abraçar os encontros e a riqueza escondida dos outros, marcada pela pobreza, mas cheia de gratuidade, e onde o caminho da participação vai ganhando contornos transformadores.

«Não é culpa dos jovens se são inconstantes. A nossa vida é precária e estamos a oferecer precaridade aos jovens, não podemos pretender perfeição. Mas eles, com criatividade ultrapassam-nos. Os jovens estão a ensinar um estilo de vida ecológico. É importante que o mundo adulto abra o coração e as portas da comunidade para fazerem, com erros e limitações, mas deixar entrar. Assim a Igreja renova-se».

«Todos temos um tesouro, um mundo belíssimo dentro e nós, que muitas vezes escondemos ou não apreciamos. No encontro gratuito, acontece sair o que somos, o que podemos fazer por nós e pelos outros».

«O nosso desafio é como ser Igreja em saída ao encontro de quem ou não é religioso ou está na dúvida ou vive de maneira diferente com outros valores, mas que estão ali ao teu lado».

«A minha mãe não era de ajudar todos, mas sempre que olhava para os pobres, que conhecia, ajudava. Eu, pequeno, observava a minha mãe que ajudava um velhinho que passava de vez em quando para consertar utensílios. Às vezes não tínhamos nada para lhe dar mas a minha mãe arranjava sempre uma tesoura, uma faca ou um guarda-chuva para ele arranjar, pagava-lhe e dava-lhe um prato de sopa quente. Isto mexeu comigo. Aquilo que vivemos com a nossa família é marcante para o futuro, fica gravado no coração».

«Foi em 1989, quando fui a Assis para uma semana de espiritualidade, e frade perguntou-me se tinha pensado ser frade e eu nunca tinha pensado; eu pensei seriamente e associei a tudo aquilo que o meu coração já vivia, também a vida simples de São Francisco. Na sexta-feira dessa semana, à frente de 130 jovens, antes de voltar para casa, disse a todos que entrava no convento».

Jun 22, 202358:30
Envelhecer, demência e solidão não têm de ser palavras difíceis, com Isabel Sousa

Envelhecer, demência e solidão não têm de ser palavras difíceis, com Isabel Sousa

Primeiro foi a formação em Política Social, mas a Psicologia foi sempre um objetivo de Isabel Sousa, que hoje, assume, está no sítio certo a acompanhar idosos e as suas famílias, através da psicogerontologia e neuropsicologia.

A demência é a sua área de eleição e o seu caminho é o combate ao estigma que pacientes e cuidadores sofrem envolvidos em falta de informação que os atira, antecipadamente e de forma desconhecida, para uma fase final da doença. Mas há muito para se viver até lá: em estímulos, promoção de autonomia, valorização das pessoas e das suas vidas até ao fim.

Co-autora do livro «Viver com Demência», Isabel Sousa preconiza a implementação de «Comunidades amigas da Demência» e literacia alargada como forma de combater estigmas e alargar cuidados a pacientes e cuidadores.

«Ainda há uma representação social da demência como a pessoa completamente incapaz. Mas sendo esta condição evolutiva e degenerativa, os primeiros sinais acontecem quando a pessoa está autónoma, com a sua voz e capacidade muito mantida. A sociedade - e os meios de comunicação social têm um papel preponderante - representam as pessoas com demência já não conhecendo os seus familiares, sem memória da sua vida. Estamos a empurrar as pessoas para a fase final, que é real, mas há anos da evolução da doença antes disso. Quase como se a pessoa deixasse de ser pessoa; e a pergunta que é faço é quando é que as pessoas deixam de ser pessoas? E nunca deixam de ser pessoas. Porque o ser pessoa não depende se eu tenho ou não memória. A pessoa está lá, continua lá, o cérebro é que já não faz a ligação».

«É importante aceitar que a velhice tem uma dimensão de solidão mas também de possibilidade do que está para vir e isso dá esperança. Envelhecer bem convida a ter os olhos postos no futuro, desfrutar ainda do que se tem pela frente e, se não for muito tempo, que seja desfrutando o melhor possível».

«Estamos a tirar autonomia a quem está a perder autonomia, quando devíamos cuidar do que as pessoas ainda conseguem fazer, quer cognitivamente como no seu dia-a-dia. A perda de capacidade muitas vezes é precoce porque não se permite à pessoa continuar a fazer o que ainda consegue fazer com autonomia. A pessoa tem de ser o mais autónoma possível, em cada momento e de acordo com as suas capacidades. O que estamos a dizer é «tu não sabes fazer». Estamos a esquecer que a pessoa consegue fazer e a achar que é melhor não o fazer».

«Hoje estamos um pouco mais à frente do que estávamos há 10 anos quando iniciei o meu trabalho nesta área. Uma das orientações da OMS é que os países tenham planos nacionais para a demência e Portugal não tinha, entretanto publicada há uns anos – Estratégia nacional da saúde para as demências, ou seja, estamos um passo à frente, mas ainda não saímos do papel. Foi pedido às administrações regionais de saúde que fizessem os seus planos locais, foram feitos e aprovados mas tanto quanto tenho conhecimento, ainda não saíram do papel.»


Jun 15, 202349:40
A ordenação sacerdotal de Rui Faia, aos 49 anos, fruto da maturidade e da escuta de Deus

A ordenação sacerdotal de Rui Faia, aos 49 anos, fruto da maturidade e da escuta de Deus

Rui Faia vai ser ordenado padre com 49 anos na arquidiocese de Évora. Chega a esta etapa da sua vida sem «utopias ou ilusões», fruto de um caminho de amadurecimento onde afirma que mesmo nos tempos de afastamento das práticas sacramentais, sentiu sempre a presença de Deus.

De uma catequese «inquieta» à participação nas JMJ de Paris, em 1997, e em Roma, em 2000, o questionamento interior que sentiu, levou-o a entrar no Seminário. Foi uma curta experiência, que anos mais tarde conseguiu ler e perceber a fundo as motivações para entrar e o porquê da saída.

Muito sereno perante a pergunta «Só agora?», Rui Faia está certo que a Igreja deveria olhar com mais atenção para as vocações tardias e acompanhar «tantos corações inquietos» que se questionam.


«Chego com o coração apaziguado. Há um caminho que eu percorri, que percorro, porque não termina - os desafios superados até aqui ganham na próxima etapa novos caminhos e dores. Há uma confiança, uma maturidade, não há ilusões ou utopias. Só temos uma vida e é importante no tempo que temos descobrir o seu sentido. É uma pena se chegarmos ao final da vida e olharmos para trás sem ter tido a coragem para fazer diferente»

«O tempo não é nosso é de Deus, nunca é tarde. Estamos a assistir hoje a várias realidades que mostram recomeços, não só na Igreja, e eu não os diria tardios. A vocação tardia acontece pela nossa distração e porque Deus não se impõe. Cada vez mais temos de parar, escutar e perceber que a pergunta que nos é colocada. A Igreja deveria atender aos corações irrequietos. Deveríamos olhar para as pessoas mais velhas que se interrogam, e não apenas sobre a vida religiosa. Sinto que há uma procura incessante, sem esquecer que há um caminho longo a fazer e requer paciência.»

«O meu regresso à Igreja acontece quando na minha paróquia chega um padre novo e que começa a dinamizar a paróquia, um pouco antes d e1997. Este fulgor novo que atraiu muitos jovens fez com que muitos de nós nos aproximássemos. Uma da primeira atividades foi o desafio de participar na JMJ, em Paris em 1997. A vivência de uma igreja mais ampla fez-me sair do espaço paroquial, que em si era já uma redescoberta, que trouxe muitos à igreja, mas o ir a paris, ver jovens de todo o mundo, estar perto de São João Paulo II, fez-me vir com o coração cheio.»

«Os verdadeiros momentos em que pude escutar Deus, foi quando tinha de ir trabalhar para Lisboa; chegava muito cedo, e enquanto esperava o autocarro, ficava dentro da igreja de Moscavide. Eram 20 minutos em que ali estava, numa experiência de silêncio, e entrava num diálogo mais íntimo. Esses momentos começaram a mexer comigo, percebendo que Deus me questionava».


Jun 08, 202301:04:38
Joana Morais e Castro e a liturgia sacramental dos encontros

Joana Morais e Castro e a liturgia sacramental dos encontros

Serão sempre as pessoas a unir a vida de Joana Morais e Castro. Mãe de quatro filhos, jurista de formação, tem dificuldade em dizer qual a sua profissão, uma vez que o seu percurso colocou-a em contacto com o IPAV, a Compassio, o Centro Comunitário São Cirilo e, mais recentemente, a Área Transversal de Economia Social da UCP.

Nesta conversa Joana Morais e Castro fala sobre a sua «primeira escola de fragilidade», sobre as cartas que ainda hoje troca com a sua mãe, sobre as conversas com os imigrantes que conheceu e lhe falavam de Deus, sobre a pergunta do seu filho que a levou, já adulta, a procurar a catequese, e sobre o «pino» que a filha Maria Joana obrigou a família a fazer para descobrir «o lado certo da vida»

«Começamos a sentir, com a Maria Joana, coisas que não sabíamos existir: exclusões, formatos de olhar para o ser humano que não sabíamos que existiam, obstáculos que não sabíamos, medos que não tínhamos – de futuro, do presente – e de repente percebemos que é tão bom - não é fácil, mas é bom. Percebemos que a perfeição estava aqui e isso levou-nos a assumirmo-nos como frágeis e levou-nos a pedir ajuda»

«As missões vão mudando e o sentido onde estamos também muda, mas o central são as pessoas. Sou profundamente apaixonada pelas pessoas. É nos encontros que escuto Deus. Em todos estes trabalhos onde estive e servi é isso que une: a fragilidade, a exclusão e o encontro, com as pessoas. Acredito que somos chamados a servirmo-nos mutuamente. Se estamos díspares de necessidade e nos podemos ajudar, se nos dermos a este encontro, vamos perceber que nos damos mutuamente. Quando há uma troca, percebemos que este é o único caminho para nos tornarmos humanos».

«Podemos escolher a beleza, seja qual for a circunstância em que estamos, mesmo que seja difícil. A beleza é uma escolha. Em todos os momentos conseguimos vê-la, mesmo nos mais difíceis, mais duros e improváveis. Quando conseguimos, na improbabilidade, ver beleza, salvamo-nos».

«Hoje tenho menos medo do erro, deixo-me permear pelo erro. E quando deixamos que isso aconteça, acontecem orações, sacramentos do encontro. É nas pessoas que encontro Deus».


May 25, 202301:01:34
Quando a escuta é lugar de construção do bem-comum, com Maria Helena da Bernarda

Quando a escuta é lugar de construção do bem-comum, com Maria Helena da Bernarda

Há lugares comuns mais importantes do que o exterior que separa as pessoas. Maria Helena da Bernarda está certa que uma lágrima será sempre uma lágrima, que a alegria será alegre quando manifestada, não importa a educação, o contexto de vida, as dificuldades ou conquistas. É essa certeza – e o que a sua partilha provoca empaticamente – que a leva a abordar desconhecidos na rua e a contar as suas histórias.

Assim acontece desde novembro de 2018 na página «Nós nos outros», onde diariamente concretiza três paixões: as pessoas, a escrita e a fotografia.

«É nos sentimentos e nas emoções que encontramos a nossa vida; é só preciso aprender a lidar positivamente com as emoções do sofrimento. É ele que nos faz crescer, aprender e também compreender melhor quem sofre. Tenho a perfeita consciência que a tristeza e a alegria convivem, não são opostos, mas caminham lado a lado todos os dias da nossa vida. É isso que eu procuro.»

«O tempo é o bem mais precioso que temos. Durante muitos anos dediquei-me a ser muito responsável a gerir empresas. Mas isso deixava-me pouco tempo para o outro lado da minha vida, nomeadamente os meus filhos, a família e os meus pequenos prazeres, como tocar piano, pintar. Houve muita coisa que ficou para trás. Quando pus os pesos, achei que estava talvez na altura de mudar a minha vida. Tive de pensar várias vezes porque se ganha algumas, perde-se outras, mas não estou nada arrependida. Todos os dias recebo palavras de gratidão por histórias que escrevo. Chego sempre revigorada para casa e penso «Sou mais feliz por ter feito isto e deixei aquela pessoa também mais feliz»”».

«Vivemos num mundo agressivo, marcado pela incerteza no futuro, o stress – tudo isto é muito difícil e penso que cada vez mais a solidariedade é necessária. Não podemos exigir só dos políticos, ao Estado, às Instituições, mas de nós próprios temos de exigir atenção ao próximo».


May 18, 202352:22
João Valério e o projeto da cidade das Jornadas Mundiais da Juventude

João Valério e o projeto da cidade das Jornadas Mundiais da Juventude

Não se pode dizer que João Valério veja o mundo entre a música e a arquitetura, mas ambas as artes têm um peso na sua vida e o arquiteto de profissão, melómano nos tempos livres, até encontra uma gramática comum. Desde cedo a arquitetura «casa» foi sendo apreendida a partir da sua experiência familiar; com o crescer, foi consolidando a «casa interior» que, naturalmente encontrou espaços exteriores para poder duvidar, questionar, confrontar e consolidar.

O jovem de 29 anos integra, com o seu violino, a orquestra que entre 1 e 6 de agosto vai tocar nos momentos celebrativos da Jornada Mundial da Juventude.

Desafiado a construir a cidade das Jornadas, gostaria de a ver como uma futura igreja a ser construída: com uma mesa onde todos cabem, um espaço sem paredes onde todos podem entrar, abeirar, experimentar, e um adro para encontros inesperados.

«Gostaria que a cidade se tornasse num espaço de convite: que as jornadas possam ser não só algo chato porque os transportes vão ficar difíceis e estarão cheios, mas que seja uma oportunidade de viver uma experiência do religioso – por vezes é algo com que as pessoas não se identificam, e isso será de respeitar, mas havendo a oportunidade de descobrir algo, então que o seja de facto, conduzindo a uma descoberta. Por vezes nunca será esse o caminho, outras vezes será depois de muitos anos, outras vezes será apenas um caminho de humanidade».

«Creio que existe uma busca muito grande pela transcendência. Pela falta de referências acaba por ser uma busca difícil, com muitos becos sem saída, em conceitos latos como a beleza - que são importantes para a vida mas que por vezes não expressam a transcendência. A busca, a inquietação interior, não encontra, por vezes, fundações muito sólidas, pontos de referência e a experiência do sagrado. Existe o anseio humano por algo mais, além daquilo que é físico, mas é difícil dar um nome às coisas e não quero dizer com isto que a ideia de Deus tenha de ser aceite por todos. Claro que partilhamos a experiência e gostamos quando as pessoas se sentem interpeladas por essa experiência, mas não se trata de uma obrigação. A religião é uma experiência de liberdade».

«A casa interior não cresce se ficar apenas dentro de casa: para isso, os amigos são muito importantes, os grupos onde nos vamos inserindo, quer na dimensão mais eclesial com grupos de jovens ligados a paróquias, como grupos onde a Igreja praticamente não tem parte – e isso também é muito importante para nos questionarmos, sendo também a oportunidade para levar a Igreja a outros que não a conhecem ou a percecionam de forma distorcida. Essa casa interior que cresce fora é essencial, naturalmente compreendendo um regresso para arrumar ideias e fazer sínteses».

«Há uma parte importante de construção de uma igreja como espaço de encontro, e nesse sentido, implicaria as pessoas que se reúnem em torno do altar, da mesa comum, que é para todos, que não exclui e a mesa que é do sacrifício mas também da refeição, e por isso, do encontro. A possibilidade de a igreja ser um espaço fora do mundo - podemos sentir que estamos num espaço diferente mas não se desliga do mundo e pode ser aberto. A igreja pode ir também para fora – não precisa de ser o espaço apenas interior, e o adro é a figura mais representativa dessa igreja que sai, e pode ser o espaço da comunidade, de sair mas onde os outros podem entrar, o espaço da festa da comunidade, do arraial, do encontro, do juntar. O espaço em que a igreja tem uma presença na cidade, não como imposição, mas como convite».

May 11, 202301:16:53
Patrícia Doro e a Igreja que se alarga

Patrícia Doro e a Igreja que se alarga

Para encontrar Patrícia Dôro é necessário ir à paróquia de Algueirão-Mem Martins, comunidade onde radica o seu crescimento na fé, onde assumiu as primeiras missões e ali conheceu diferentes dons, caminhos e formas de unidade na Igreja. É àquele espaço que sempre regressa apesar dos muitos lugares por onde já andou e que lhe deram uma vida crescente e alargada da Igreja. Nas suas palavras encontramos uma certeza de estar no lugar certo, descoberto e confirmado em cada projeto, em cada desafio, em cada encontro. Integrar a organização da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 é mais um passo da Igreja que se alarga, mas que cresce com a simplicidade, genuinidade e sonho.

«Desde cedo intui que se Deus me colocou naquele espaço é ali que devo servir, foi ali que crescei. A novidade que conhecemos noutras comunidades pode levar-nos a pensar que outros fazem melhor, ou são mais comunidade, mas sinto que sou sortuda porque sou chamada a ir beber a esses lugares novos para trazer para o meu lugar. Deus também nos vai construindo nos lugares onde nos coloca. Faz-me muito sentido servir a comunidade».

«Continuo em jornada desde 2019. Fui estando envolvida nos processos e quando começámos a organizar equipas, pude relacionar-se com os peregrinos nacionais. Os diretores intuíram que era importante cuidar dos nossos, a chamada Rede Igreja, onde nos relacionamos com os 21 COD, sendo rosto das pessoas que querem participar».

«É muito bom partilhar cansaço e irmo-nos animando uns aos outros. A bola vai crescendo e quem acompanha a peregrinação dos símbolos, sente isso - a transformação que acontece pela passagem dos símbolos da JMJ pelos locais. É interessante perceber como diferentes convites vão surgindo ao longo do caminho até à Jornada».

Apr 27, 202349:24
Mafalda Lapa quer sonhar a escola com os alunos e construir o futuro da sociedade com todas as capacidades dos jovens

Mafalda Lapa quer sonhar a escola com os alunos e construir o futuro da sociedade com todas as capacidades dos jovens

Nem sempre quis ser professora mas quando Mafalda Lapa se viu, pela primeira vez, numa sala de aula com alunos percebeu que a sua vocação, missão e o seu coração estavam no mesmo local. Estudou Biologia vegetal aplicada mas desistiu da investigação para entregar a resiliência com que cresceu aos estudantes do Agrupamento de Escolas da Cidadela, em Cascais. No gabinete GUIA, recebe estudantes à procura de melhorar as notas e investir no seu futuro, mas também ali conhece desabafos que precisam de silêncio, espaço para contar a sua história e para reconhecerem ter todas as capacidades para sonhar o futuro.

«Cultivamos pouco saber que é humano a pessoa sentir que não tem capacidade, sentir-se mal, estar triste – tudo isto faz parte, achar que a vida não vai mudar, ou que nos acontece uma desgraça e que isso se vai arrastar negativamente para o resto da nossa vida – é humano pensar isto. Cultivamos muito o sucesso, mas muito pouco a imperfeição. Na escola, cultivamos pouco o erro, nós castramos o erro».

«Digo aos alunos que estão sempre a tempo de mudar o seu percurso, a escolha que fizerem não vai ser para sempre, vai haver oportunidades. «Segue o teu instinto, mantém-te atento, olha o mundo, aprende novas competências, garante que todos os anos aprendes alguma coisa nova». E como escola temos esse dever – abrir o nosso espaço ao mundo, para que os alunos possam conhecer o que está lá fora e decidam o seu caminho».

«A escola hoje apresenta muitos problemas emocionais por resolver, muitos conflitos, é um lugar tenso, mas é também um lugar atento, como acho que nunca foi. A escola é das melhores instituições que temos, mesmo quando os alunos reprovam ou com situações de indisciplina, a escola não larga ninguém, não deixa ninguém para trás. No espaço escolar há muitas pessoas diferentes, muitas vezes fechados na mesma turma, e a escola está a ensinar a viver. Nós fazemos isto, por isso os professores devem ser bem tratados e reconhecidos».

«Um encontro de jovens de tantos países só pode trazer muitas coisas boas. Esta é a oportunidade de se reunirem muitos jovens: ouvir e depois passar à ação. Só o ouvir, no momento atual, é pouco. O mundo precisa de ação. Precisamos de tempo para ouvir e refletir, mas precisamos depois de ação. A ação dá trabalho, mas em grupo custa menos».

Apr 20, 202301:11:22
Do silêncio e da vida fraterna das Monjas de Belém à arte multimédia na JMJ, com Isabel Novais

Do silêncio e da vida fraterna das Monjas de Belém à arte multimédia na JMJ, com Isabel Novais

Atraída pela simplicidade de vida e pelo absoluto, Isabel Novais foi Monja de Belém durante cerca de 13 anos. Dentro do mosteiro de clausura descobriu que as irmãs eram felizes e que o silêncio e solidão que conduziam os dias eram um caminho para a relação com Deus. Em Sesimbra, durante quatro anos, e depois em França, ao longo de sete, conheceu o coração da Igreja, descobriu a beleza da liturgia, fez beleza com as suas mãos nas diversas artes que a monjas produzem. Um dia sentiu que o seu lugar não era mais ali, mas mantém hoje a certeza que aqueles anos foram os melhores na sua vida. Isabel Novais emprega hoje os seus dons na organização da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023, apresentando este grande encontro ao mundo.


«Quando me perguntam porque fui para o mosteiro eu digo: «Pela mesma razão pela qual as pessoas casam». Se há coisa que não me acontece é arrepender-me. Valeu tudo a pena. Se hoje voltasse atrás e se Deus me mostrasse que iria para o mosteiro e ia sair depois sem nada, eu ia na mesma. Não perdi, eu só ganhei».

«A liturgia católica romana, dentro do mosteiro da família das Monjas de Belém, conciliam os dois ritos, os dois pulmões da Igreja. Isso traz muito. A liturgia faz entrar no mistério e na comunhão fraterna. Cantarmos juntas, seguir o outro é um momento de comunhão, mesmo que não haja conversa. Ali, tudo converge para o mesmo»

«O que a minha vida poderá dizer é que vale a pena arriscar em Deus. Só ficamos a ganhar. A experiência que eu tenho é que se deve arriscar perante um pequeno convite de Deus. Foi o que experimentei toda a minha vida. Não estou arrependida de ter saído, mas tudo faz parte de um projeto maior de Deus».

«O facto de vivermos este tempo de preparação, todos os dias reunimos no Ângelus (oração do meio-dia); celebramos missa em conjunto na Semana Santa rezámos as Laudes. Criamos um ambiente para vivermos um encontro (Jornada Mundial da Juventude). É um pedaço de Igreja. Constantemente há grupos a passar. Estamos a preparar um encontro mas nós já nos estamos a encontrar».


Apr 13, 202301:01:53
O rap, a «sagrada família» que ajudou em Lesbos e o alter-ego musical do psicólogo João Ameal

O rap, a «sagrada família» que ajudou em Lesbos e o alter-ego musical do psicólogo João Ameal

Conversamos com João Ameal e com João Sem-Tempo. São a mesma pessoa, em duas facetas entre tantas que o compõem: psicólogo educacional que até faz rap se essa for a linguagem eleita para conseguir fazer o processo terapêutico com o seu paciente, e o músico que corre atrás do tempo para deixar que essa expressão intrínseca à sua vida saia de si. Pelo meio há ainda os 10 minutos que dedica, todos os dias, a sentir o sol, a sentir a fé que sempre o acompanhou – apesar das dúvidas – e a agarrar uma mão, que sente presente na sua vida. João Ameal regressa ainda, nesta conversa, a Lesbos, acompanhado pela mulher, naquela que foi “uma segunda lua-de-mel especial”, ocasião onde ajudaram uma «sagrada família».

«A crise dos refugiados estava mais presente que nunca e sentíamo-nos muito impotentes e desinformados, na verdade. Envolvemo-nos com a Plataforma de Apoio aos Refugiados e fomos, como voluntários. Um campo de refugiados em termos de saúde mental é mais grave do que estar preso: ali não há previsão, é a vida em suspenso com adultos muito deprimidos, crianças aos Deus dará, muitos traumatizados com a guerra e a viagem e eu olhava e não sabia o que fazer»

«Ligaram-nos às 4h da manhã, pegamos no carro que era da PAR e fomos ter ao campo para supostamente ajudar um casal, cuja mulher estava grávida de gémeos, teria entrado em trabalho de parto e foi levada para o hospital. Fomos chamados para ficar com os filhos, mas quando chegamos, percebemos que afinal havia um tio disponível. Um tradutor manifestou vontade de ir ter com o casal ao hospital, que teria dificuldades de comunicação e decidimos levá-lo de carro. Quando chegamos ao hospital, disseram que a mulher não estava lá – afinal era uma intoxicação alimentar e tinham-na mandado embora, às 5h da manhã, com três graus negativos e a vários quilómetros de distância do campo. Percorremos ruas à procura do casal, finalmente encontramos e mal a mulher entro no carro desmaiou. Nem acreditavam que alguém podia estar à sua procura, sentiam-se sós e abandonados pelo mundo. Nunca vou esquecer o olhar do marido, de impotência. Aquele casal, para mim, foi uma sagrada família - sozinhos e rejeitados, à procura de uma estalagem. O nosso carro velho foi um anjo a chegar. Num lugar onde não há nada, um gesto faz uma enorme diferença».

«Temos uma segunda pandemia em mãos, mas é muito silenciosa que é a pandemia da saúde mental. Os números têm sido exponenciais. Todos os dias acompanho mais um adolescente com um ataque de ansiedade, de pânico. Isto é uma doença que mata e muito, e tem de ser encarada de forma séria ou arriscamo-nos a perder esta geração. Estou preocupado com os números alarmantes de miúdos que estão deprimidos, ansiosos, medicados. Se a geração acima não se preocupar seriamente em abordar isto com cuidado, vai ser muito difícil com esta geração chegar a um mercado de trabalho, tornar-se autónoma».

«O nosso mundo é muito rápido, demasiado exigente e a maior parte das pessoas acaba por fazer coisas em piloto automático. A imagem que tenho é de estarmos a correr numa passadeira do ginásio sem ir a lado nenhum, porque na verdade não sabemos para onde corremos. Algumas pessoas que acompanho estão desenfreadas à procura da felicidade, mas não sabem o que é e não sabem onde encontra-la. Criam objetivos que acham que é o que precisam, e correm atrás; quando lá chegam compreendem que não era aquilo, e gastam-se no caminho. Acredito que a felicidade passa por desacelerar primeiro, olhar à volta, viver uma coisa de cada vez, no presente e não no futuro que não vai chegar e não vai ser o que pensávamos que iria ser».

Mar 30, 202301:03:04
Do grupo «FigoMaduro» ao trabalho a solo «No Monte», Luísa Vidal cresceu ao som da música e dos valores que ela transmite

Do grupo «FigoMaduro» ao trabalho a solo «No Monte», Luísa Vidal cresceu ao som da música e dos valores que ela transmite

A voz doce de Luísa Vidal acorda na memória o projeto musical «FigoMaduro», que continua hoje de norte a sul a percorrer estradas em contacto com pessoas e palcos diversos. O grupo que integra com a mãe Madalena, as irmãs Maria e Madalena e o irmão João, semeou na sua vida a certeza que a música chega ao coração das pessoas e, dessa forma, se podem passar mensagens humanas, reflexivas e inspiradoras. Luísa Vidal lança-se a dolo agora num primeiro trabalho «No Monte», totalmente produzido no Alentejo, onde letras e músicas da sua autoria convidam a entrar no seu mundo, a conhecer o seu percurso e valores que quer dar aos outros.

«Olho para a música como partilha de mensagem. O EP tem músicas mais pessoais, mas tenho um rol de outras por lançar que são reflexões transversais. O meu objetivo é fazer as pessoas pensarem para além do quotidiano. A música é uma mensagem que chega diretamente ao coração. E eu gosto de pensar na minha música pode ser uma ajuda para quem a escuta». «Ao longo do meu percurso, mesmo enquanto estudava, procurava nas férias ir para fora e isso levou-me projetos de voluntariado e a procurar experiências que me foram enriquecendo a nível humano e moldando a visão que tenho do mundo e, por isso, as minhas composições também. O que podemos aprender uns com os outros, independentemente das condições em que nascemos e crescemos, marca o que escrevo». «(Fazer a formação na Academia de Líderes Ubuntu) Permitiu-me fazer um processo de crescimento pessoal enorme mas deu-me ferramentas para ir ao encontro do outro. Isso foi-me dando reportório de linguagem para desenvolver ideias que germinavam e compor. Acho que vinha de trás (a certeza da composição e da música na sua vida), mas a Academia deu-me espaço para criar ideias que eu já tinha». «Casei com um engenheiro agrónomo, e teríamos de procurar aquele lugar, mas fui à procura de uma vida menos agitada, com mais tempo, a dar tempo ao estar. Permitiu-me dedicar tempo a composições que já estavam feitas, mas escutei-as de forma diferente, e pude pensar na sua produção. Aquela tranquilidade e espaço inspira-me para produzir estas músicas».

Mar 23, 202345:18
A experiência «íntima», «sublime», «perfeita» que a música oferece contada por Sérgio Peixoto

A experiência «íntima», «sublime», «perfeita» que a música oferece contada por Sérgio Peixoto

Sérgio Peixoto é amante de música: neste adjetivo cabe a história que foi construindo desde que aos cinco anos, quando sentiu que a música que a sua mãe e avó cantavam lá em casa, significavam acolhimento e segurança.
O seu percurso como cantor, diretor ou investigador levou-o a percorrer o mundo em diferentes projetos musicais: grupo Olisipo, Tetvocal, Coro Gunbenkian, «Sete Lágrimas» e «Mãos que cantam» são diferentes formas de experimentar a música e as sensações que ela permite.
Sérgio Peixoto assume que a música foi um caminho espiritual que se abriu na sua vida quando começou a descobrir os clássicos, Mozart e Bach, mas também a recuperar música antiga, renascentista e romântica.
O prazer de parar o tempo quando o sublime acontece em palco é algo que quer guardar para si, até mesmo antes de o oferecer ao público, e reconhece que tantas vezes tem sido um privilegiado por sentir «o vento do Espírito».

«Mozart e Bach foram essenciais. Quando começamos a descobrir estas músicas e a cantar as músicas, a entendê-las, o universo espiritual abre-se. A minha sensação é quando estou a cantar ou ouvir – já não é só o cantar – parece que a porta do céu se abre e mil imagens, mil sensações complementam-se nesta atitude mais espiritual.»

«A música, no seu sentido mais abstrato, não se pode tocar. É como o espírito. Quando participei numa obra «A missa de Pentecostes», composta por João Madureira para o grupo «Sete Lágrimas», senti que a música é o vento do Espírito. Gosto muito desta imagem e utilizo-a muito. Acho esta atitude muito íntima e religiosa. O silêncio, o som, estas duas coisas que parecem tão diferentes, não o são. O vento é muitas vezes um remoinho, às vezes é uma brisa, outras vezes é um furacão intenso. Gosto de pensar que é o Espírito Santo que nos orienta e guia.»

«Bach escutou Deus e Deus estava sobre o ombro de Bach a dizer «Estás a ir bem! É mesmo esse o caminho!» Tenho amigos que não são crentes e acreditam em Bach, que há ali algo de transcendente, de espiritual. Mas não conseguem explicar. Não sei se é pela técnica aprumadíssima do compositor – não é só isso – também a alma e julgo que esse vento do Espírito que cai sobre Bach, e ele transmitiu nas suas partituras, que durma até hoje, têm um efeito impressionante, mesmo nas pessoas que não creem. É o som, a melodia, a harmonia, eu chamo de matemática espiritual. Não há mais nada – é impossível. Já não era possível ir mais além. Não consigo explicar por palavras, é qualquer coisa de religioso para quem crê, mágico para quem não crê.»

«Desenvolver a língua gestual portuguesa, no seu aspeto artístico e estético, era algo que não se fazia e já se faz graças ao grupo «Mãos que cantam». A forma como se interpreta está a mudar porque veem os surdos a fazer este trabalho. Construímos gestos de direção musical que são diferentes dos gestos para um coro de ouvintes e desenvolvemos a língua gestual portuguesa no sentido estético e artístico do termo, tal como criamos gestos para conceitos que não estavam definidos, nem era uniformes no universo surdo. Isto é o desenvolver de uma língua».

Mar 16, 202301:19:15
A fé partilhada em comunidade na experiência de Maria Francisca Silva

A fé partilhada em comunidade na experiência de Maria Francisca Silva

Maria Francisca Silva pertence às Comunidades de Vida Cristã, ligada à espiritualidade inaciana, porque entende que a vida de fé tem de ser partilhada e rezada em comunidade. É isso que tem procurado fazer desde sempre, por isso, falar do seu percurso de fé implica regressar à comunidade paroquial, à catequese, às experiências de voluntariado, ao colégio católico, mas, mais recentemente, ao desafio de integrar uma plataforma mundial de reflexão sobre a fé e a espiritualidade nos jovens, e também à tarefa de ser pivot de ligação da CVX ao COL, responsável pela organização da JMJ Lisboa 2023. Nesta conversa conhecemos ainda o sonho desde pequena de ser médica, porque queria servir, mas também pelo fascínio que o corpo humano sempre lhe causou. A sua especialidade é Medicina Geral e Familiar porque acompanhar pessoas desde a sua conceção até à sua «4ª ou 5ª idade» é o que quer fazer para o resto da sua vida.

«As JMJ são uma ocasião para os jovens se reconhecerem como Igreja, tal como eu me reconheci em 2011; dizerem sim e que querem fazer parte do corpo da Igreja. Quando nos reconhecemos como parte de algo, queremos contribuir, e as jornadas podem ser uma forma para os jovens perceberem como podem ser os mãos e os pés de Jesus.»

«(A Plataforma) Procura responder a uma presença e participação de jovens na Igreja, à procura de viver a espiritualidade nas suas relações. A CVX percebeu que os jovens fazem parte do seu corpo e quer perceber que dinâmicas e sonhos os jovens têm e querem implementar.»

«O sonho da medicina vem desde pequena: é uma forma de servir, cuidar do outro e estar presente; mas tenho um fascínio enorme pela forma como o nosso corpo funciona, e está organizado: a forma como as células se diferenciam e todas juntas colaboram para o que é preciso, como um neurónio comunica com sinais elétricos e nos faz sentir dor, emoções.»

Mar 09, 202301:01:30
O silêncio e a procura, a guerra na Ucrânia e os seus cheiros, o extraordinário e o espanto nas fotografias de Rui Caria

O silêncio e a procura, a guerra na Ucrânia e os seus cheiros, o extraordinário e o espanto nas fotografias de Rui Caria

Rui Caria diz que é do silêncio, mas o fotojornalista que esteve 40 dias na Ucrânia, depois da invasão da Rússia a este país da Europa, é também das palavras: é do simples e do profundo, é do espanto e do extraordinário nas fotografias que capta e publica, é da paz e do silêncio que as estradas dos Açores lhe oferecem, ou da bruma e da tempestade açoriana que tanto gosta e onde diz, aí talvez encontre Deus. Nesta conversa falamos do trabalho, que não foi só trabalho, na Ucrânia, do cheiro e das fotografias de rostos que por lá tirou, de outras tantas imagens que preferiu não captar para não mostrar, e do muito que as suas imagens não captaram mas mostram.

«Quando achamos que aquilo é normal, é perigoso. Quando achamos que ver gente morta pelo caminho é normal, é altura de vir a casa ou vir para casa»

«É muito fácil regressar ao cheiro e sobretudo não nos esquecemos do que pensamos quando começamos a cheirar certas coisas, como a morte. Começamos a tentar refletir sobre aquilo. Lembro-me de termos descoberto 11 corpos de soldados russos numa vala comum através do cheiro. Isso faz de nós animais? «Para o carro porque há aqui alguém morto», ou alguma coisa morta – também usamos este tipo de linguagem. Alguma coisa porque é o indefinido: um cão morto, um gato morto, um rato morto cheira ao mesmo que um homem ou uma mulher morte. Na morte cheiramos todos ao mesmo»

«A fotografia para mim é documento, eu não posso fazer arte com a desgraça dos outros. Os conceitos da fotografia fazem-me andar atrás das fotografias. Para ser fotografia temos de olhar para as coisas como crianças, com a curiosidade de uma criança»

«(Já fotografaste Deus?) Ele sabia que eu não tinha resposta para isso. Ainda ando à procura de Deus. Não sei se acredito em Deus - espero que ele acredite em mim. A procura de uma presença aparece naturalmente na cabeça das pessoas, também na minha. Se vir uma trovoada, uma neblina ou uma bruma, uma tempestade nos Açores, ai parece-me que Deus existe, que Deus é isto. Acho que Deus são acontecimentos, são pedaços de coisas. Falo muito sobre a morte e a vida com o Júlio, mas surgem sempre mais perguntas. E as perguntas também nos fazem avançar».

Feb 23, 202301:23:35
Missão País foi o reinício da vida cristã de António Sequeira Lopes

Missão País foi o reinício da vida cristã de António Sequeira Lopes

António Sequeira Lopes iniciou a sua participação na dinâmica da Missão país em 2018, enquanto estudante da Faculdade de Belas Artes, em Lisboa, e assume que foi ao engano. Mas aquela semana foi o princípio de uma vida.
Nunca deixou de fazer perguntas sobre o sentido da vida, depois de em pequeno se ter afastado da prática cristã. Naquele ano, em Chão de Couce, entre 50 “miúdos” que abrem o coração nas partilhas de vida, “riem, choram e cantam em conjunto”, os pontos ligam e percebe que “Deus esteve sempre lá a escutar as perguntas que mandava para o ar”.

«O que melhor descreve a minha experiencia de fé é a simplicidade. Na Missão País estão 50 miúdos a falar de coisas sérias enquanto riem, cantam e choram. Como é que isto é possível? Isto é para quê? Não pode ser para nós e para nosso benefício. Tem algo mais. Como é que Deus se encontra aqui? Está em todo o lado, em cada conversa e partilha. E nessa simplicidade, os pontos começam a conectar-se e Deus diz ‘sempre estive aqui’.»

«Ser chefe de oração, tendo começado um caminho mais sério em 2018, parece uma responsabilidade muito grande - temos o alinhamento espiritual da semana nas mãos. Fiquei muito contente e emocionado e é uma confirmação do que este caminho que faço.»

«Se não tivesse acontecido missões na minha vida, muita coisa não tinha sido vivida. Há sempre mais questões que respostas mas ainda bem que há um espaço onde as posso colocar. A missão país não é uma conversão direta, mas pode ser o início de algo. Ser católico é difícil: é um trabalho constante de superação, de continuidade, de conversa, diálogo e que requer alguma rotina.»

«Aprendi muito em Belas Artes sobre pessoas, histórias, tolerância, empatia. Existe uma liberdade entre artistas, encontramos questões de identidade, de filosofia de vida que nos leva a pensar numa única coisa: perceba-se ou não, tudo o que está por trás, são pessoas com histórias, traumas e problemas, alegrias e frustrações iguais. Posso não perceber o que estás a sentir mas percebo que devo respeitar e ouvir-te.»

Feb 16, 202301:09:38
A enfermagem, as viagens das cinco JMJ e o amor em Calcutá, com Pedro Moisés

A enfermagem, as viagens das cinco JMJ e o amor em Calcutá, com Pedro Moisés

Pedro Moisés gosta muito de pessoas e não esconde um carinho especial pelas pessoas mais velhas. Ter vivido com as suas avós ajuda a isso, e talvez explique a sua vocação de enfermeiro, mas a passagem pelos cuidados paliativos, já formado, ajudou-o a perceber que o importante na vida e nos cuidados é o agora: o telefonema que não se adia, o toque que não se esconde, a palavra que não se nega, o passeio que não se atrasa.
À vocação para cuidar junta-se o imenso gosto em viajar: se as viagens forem a capitais onde a Jornada Mundial da Juventude esteja a acontecer, melhor ainda: Colónia em 2005, Madrid em 2011, Rio de Janeiro em 2013, Cracóvia em 2016 e Panamá em 2019, foram destinos que não mais se esquece – da festa, das palavras e dos encontros - assim como de Calcutá, em 2018, onde durante cinco semanas cuidou de moribundos e onde aprendeu o que é o amor.

«Inicialmente de uma forma mais obrigatória – temos muitas histórias engraçadas da hora do terço porque dava-nos vontade de rir e a minha avó punha cada um no seu quarto, de rádio ligado, para continuarmos a rezar; lembro-me de levantarmo-nos às 6h30 para irmos à missa às 8h porque a minha avó dizia que a das 11h era para os preguiçosos – mas hoje reconheço que estes pedaços de fé da minha avó marcaram a minha infância e o meu percurso espiritual»

«São Bento Menni dizia que uma pessoa vale mais do que o mundo inteiro. A enfermagem olha para a pessoa, quer cuidá-la no seu todo e esquecer o resto. E tantas vezes é difícil porque sabemos que os cuidados de saúde mudaram muito e é difícil ter tempo. Nem o médico nem o enfermeiro querem só dar resposta às necessidades biológicas do doente: nenhum enfermeiro ou médico estudou para isso, mas queremos dar resposta à pessoa como um todo»

«Havia pessoas que recebíamos (na casa dos moribundos, em Calcutá) e que não estavam em fase terminal e uma irmã explicou-se que recebiam aquelas pessoas a quem lhes ia ser dado um banho, fazia-se a barba, dava-se uma refeição e roupa lavada. Lembro-me de ter dito à irmã: «Que desperdício, a Índia é muito grande, não se podem salvar todos». E a irmã respondeu-me «Pedro, isto é o amor. Nós gastamo-nos sem ter nada em troca e vale a pena. A pessoa vai voltar para a rua mas ela foi amada na mesma. As pessoas que apenas aqui ficam cinco minutos e depois morrem, valem a pena porque nesses cinco minutos elas foram amadas». Quando me vim embora elas disseram-me que Calcutá estava em Lisboa, que a solidão existia cá assim como pessoas a morrer sozinhas»

«Recordo-me de entrar em Colónia por uma das pontes e ver as bandeiras no ar, todos a cantar os mesmos cânticos mas em línguas diferentes, encontrar ruas alegres com ambiente saudável e alegre. Conheci jovens com caminhadas muito diferentes. Conheci um grupo de jovens chineses que me falaram da Igreja perseguida. Dei-me conta de uma Igreja universal e percebi a minha responsabilidade de construir a Igreja com os outros, de como me devia preocupar e rezar por eles»

Feb 09, 202301:05:56
Cultivar o espanto e agarrar as oportunidades de crescer levou Mariana Craveiro a integrar equipa de comunicação da JMJ Lisboa 2023

Cultivar o espanto e agarrar as oportunidades de crescer levou Mariana Craveiro a integrar equipa de comunicação da JMJ Lisboa 2023

O sorriso de Mariana Craveiro encontra-se nos olhos, quando pensa nas oportunidades que teve ao longo da sua vida para crescer em Igreja, procurando responder às muitas perguntas que foi tendo. Crescer deu-lhe calma na procura das respostas, mas não lhe tirou as perguntas e a capacidade de se espantar com o que lhe é dado viver todos os dias. Com formação em Relações Públicas e Comunicação Empresarial, deixou o seu trabalho num agência de comunicação para ir trabalhar para a Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023, uma oportunidade «única» de ajudar a preparar um encontro que, afirma, está a contribuir para construir a Igreja e a aproximação entre todas as pessoas.

«Quando era nova havia coisas da Bíblia que não percebia e não queria fazer o Crisma, mas a interpretação que temos, vai mudando e vou-me relacionado pessoalmente com as parábolas e muda o nosso entendimento. Quando cheguei à adolescência tinha muitas questões e poucas respostas. O caminho que fiz foi perceber que era importante ter perguntas e não ter todas as respostas. Há coisas para as quais achamos ter respostas, mas elas mudam e mais tarde a resposta até vai ser outra. Mas Deus não muda, vai só mudando a forma como interpreto a resposta que me está a dar».

«Uma parte mais humilde na minha história vem destas origens: no verão apanhava a pera, ou a batata, ou fazia a vindima. Toda esta vivência é uma bagagem que se leva e não deixamos de estar orgulhosos por ter vivido isso. Uma forma de valorizar o trabalho e a nossa entrega e serviço. Os pais deram-nos os pilares da família, do serviço ao outro, do trabalho. A nossa vida concretiza-se quando a damos aos outros - esta é das maiores heranças que tenho dos meus pais».

«(Na JMJ em Cracóvia, em 2016) Não conhecia jovens que estivessem na fé como eu e de repente estou com milhares de jovens que estavam a viver o mesmo que eu. Fiquei numa escola, num pavilhão, tomava os meus banhos de água fria, comia os meus picles ao pequeno-almoço mas para mim tudo era bom. E eu estava ali com o Papa. Naquele sítio estávamos todos para o mesmo».

«Não fui (à JMJ) com tudo entendido – tinha 18 anos, fui à aventura - mas vim de lá com uma noção maior sobre o que era a Igreja. Fui à aventura e com a ideia de estar com o Papa e com muitos jovens e vim de lá com uma noção maior do que era a Igreja. Estava muito certa e cheia do que era a Igreja e já não era uma realidade só minha. Tantas pessoas que acreditam no mesmo e que cantam o mesmo, como é possível eu duvidar?»

Jan 26, 202353:22
As janelas onde Timóteo Cavaco foi confirmando o estudo da Bíblia e o caminho conjunto dos cristãos

As janelas onde Timóteo Cavaco foi confirmando o estudo da Bíblia e o caminho conjunto dos cristãos

Timóteo Cavaco afirma ter crescido numa «bolha» Batista, onde o outro era o católico que mais tarde descobriu ser a maioria. Mas isso não o fez diminuir certezas no seu caminho: dividido entre dois amores, quando ainda o sonho de ser um médico missionário pairava, as humanidades acabaram por falar mais alto. À licenciatura em Bioquímica, juntou depois a História, a Filosofia, os estudos Bíblicos e ainda hoje, tantos outros interesses que confirmam a sua vontade, e necessidade, de abrir janelas.
Em outubro assumiu funções como presidente da direção da Aliança Evangélica Portuguesa, apesar de sublinhar privilegiar o diálogo entre as bases. Até 2025, gostaria que o diálogo interconfessional não ficasse em segundo plano porque acredita que o conhecimento e a linguagem do amor, quando falada nas diversas línguas cristãs, provoca maior impacto e beneficio na sociedade.

«A Bíblia esteve presente desde que começamos a falar as primeiras palavras: memorizámos versículos bíblicos, essa identificação com um Deus trinitário, esteve sempre presente na minha aprendizagem, anterior até à alfabetização. Já numa fase de adolescência e de confronto com a identidade, foi muito importante descobrir o significado de alguns textos: perceber que a minha vida podia ser uma oferta constante a Deus»

«A evidência de Deus acontece, naturalmente através de uma revelação dada pelas escrituras e de Cristo, mas também através do que vemos: olhar a natureza, a existência de uma forma geral que nos remete para esta pergunta essencial: como é que tudo isto existe, como podemos compreender tudo isto sem pensar em Deus?»

«Nos recentes resultados do Census 2021, percebemos que uma das áreas da população que mais cresceu foi a dos que se consideram «sem religião», o que talvez não descreva a realidade; sei que tinha sido proposto ao Instituto Nacional de Estatística a inclusão de uma categoria de «crentes sem religião», que não foi aceite. Mas devemos perceber que dentro dessa categoria lata de «pessoas sem religião», vamos encontrar ateus, agnósticos e também pessoas que não se reveem em nenhuma das opções anteriores e no entanto vivem algum tipo de religiosidade, muitas vezes até cristã – um acreditar sem pertencer a nenhuma instituição»

«É natural que os cristãos se expressem através de diferentes pertenças. Se assim não fosse, talvez não encontrássemos essa diversidade logo no I século. Há tradições diferentes, e não falo apenas dentro das grandes famílias cristãs: recordo a diversidade que há no campo evangélico, mas também aquela que se encontra nos carismas dos movimentos, nas paróquias e até nas dioceses católicas. A minha identidade protestante ficou fortalecida pelo conhecimento dos outros. Estou muito bem como cristão evangélico, sinto-me muito bem, identifico-me como tal e as outras referências cristãs acontecem não por oposição ou confronto, mas por encontro»

Jan 19, 202301:13:16
A gratidão, a construção da paz e o lugar das dúvidas no caminho de Helena Marujo

A gratidão, a construção da paz e o lugar das dúvidas no caminho de Helena Marujo

Falar de Psicologia Positiva em Portugal é falar sobre Helena Marujo e perceber como esta área que investiga desde o final dos anos 90, juntamente com o seu então colega e marido Luís Miguel Neto, é seguida e comprovada pessoalmente como benéfica e construtora de «felicidade pública».
Nesta conversa ficamos a conhecer como a fé, inicialmente entregue como herança familiar, se tornou na companheira de reflexão, de “perguntas e questões”, que levam Helena Marujo a ler a realidade e a procurar a justiça, igualdade e novos modelos económicos e de olhar para “os que não se veem, não têm voz, e vivem as maiores dores”.
Se a pandemia da Covid-19 permitiu uma das maiores vitórias sociais – a capacidade de o ser humano se afirmar vulnerável e entender que o seu semelhante pode partilhar as mesmas dores – deu a Helena Marujo a maior dor: a perda do marido em tempo de pandemia. Este acontecimento conduziu a uma «aprendizagem brutal», para «reencontrar sentido», redescobrir forças mas também sentir ao seu lado uma «rede extraordinária, absolutamente divina» de pessoas que a levaram, depois, a celebrar a capacidade de perceber o que é realmente importante e faz feliz o ser humano.

«Participei na Juventude Universitária Católica, onde a presença de Deus era constantemente proposta como um compromisso social, politico, económico, nas escolhas de vida e o processo de evangelização, como uma maneira de viver Deus. Tive o privilégio de ter muita gente que em ajudou nesse caminho, a refletir criticamente – para mim é uma palavra muito importante – e isso aplica-se a todas as dimensões da minha vida, incluindo este caminho de espiritualidade, ligado a uma crença em algo de tão intangível e tão presente. Não vejo outra forma de concretizar o amor se ele não for a partir desta maneira de viver que também nos desinstala por causa de todos os que não são vistos. Para mim a proposta que vem desta fé católica, tem mesmo de ser vivida verdadeiramente com coerência, no que é amar sobretudo aqueles que não se veem, que não têm voz, que vivem as maiores dores, independentemente da sua posição social».

«Como é que mantemos e vivemos a alegria sem a perder depois da maior perda da minha existência e onde estava o novo caminho que necessitava fazer. Foi um período muito difícil e exigente mas também de redescoberta de forças, não apenas a nível individual, mas sobretudo da rede extraordinária, absolutamente divina de pessoas que têm estado ao meu lado. Chorámos e rimos em conjunto, reencontramos o propósito e também, por isso, celebrei o facto de termos sido capazes de nos perguntar, como humanidade, o que seria realmente importante, onde estava a essência, o que estaríamos a viver que não nos tornava coerentes, mas desalinhados com uma vida vivida com sentido. Esses passos foram transformadores, celebrativos, juntamente com uma dor de profundo desânimo, mas foi feito num diálogo porque estávamos uns com os outros».

«Quanto mais usarmos palavras de desânimo, de descrença, desconfiança, o nosso discurso individual e até o coletivo, cresce. Somos pessoas basicamente boas. Estamos num momento da história em que isso é cada vez mais visível - estamos mesmo a fazer uma trajetória de reconhecimento que queremos viver vidas que valham a pena, não apenas para nós, mas saber qual o nosso lugar no mundo. É a dimensão da felicidade pública. Faz sentido eu ser virtuoso se isso for contributivo para uma sociedade que precisa das minhas virtudes, de mim quanto mais iluminado possível. Importa perceber como é que eu estou a ajudar que o mundo seja o lugar que eu desejo».

Jan 12, 202301:06:11
As pessoas, as histórias e os cinco sentidos nas fotografias de João Porfírio

As pessoas, as histórias e os cinco sentidos nas fotografias de João Porfírio

A paixão pela fotografia começou cedo na vida de João Porfírio, em Portimão. Quando aos 15 anos a sua primeira fotografia é assinada e publicada num jornal, decide fazer disto a sua profissão. Em 2015, aos 19 anos, com 321 euros no bolso deixou um estágio e partiu para fotografar a crise dos refugiados, tendo estado em cinco países. Desde então já realizou reportagens no Iraque, França, Espanha, Reino Unido, Alemanha, Croácia, Sérvia, Turquia, Grécia, Hungria, Eslovénia e Marrocos, e este ano acrescentamos o Brasil, onde esteve um mês e meio a cobrir as eleições presidenciais, e também os três meses que passou na Ucrânia. As suas fotografias têm pessoas e as suas histórias dentro. Entre fevereiro e maio foram muitos os cidadãos ucranianos que lhe disseram: «Obrigada por estar aqui, conte a minha história». É isso que João Porfírio quer fazer.

«Na Ucrânia toda a gente dizia: conte a minha história, obrigada por estarem aqui. Conte a minha história. Obrigada por contarem ao mundo que o meu filho foi morto com uma bala na testa, obrigada por contarem que tive de enterrar o meu marido no quintal da minha casa, que a minha vizinha foi violada por 10 homens das tropas russas. Não consigo contabilizar as pessoas que me disseram obrigado: «Ainda bem que vieram, ainda bem que estão aqui». Eles perderam os familiares, perderam tudo - querem que o mundo ocidental saiba o que ali se passa»

«A primeira imagem que vi, foram as filas de pessoas a sair da Ucrânia, e eu a entrar, na zona de Lviv. A primeira grande cidade onde estive e onde fiz as primeiras fotografias. Para se perceber o quão prematuro eu cheguei, estive na estação de comboios, onde uma semana depois, chegaram jornalistas do mundo inteiro, e no dia 25 eu era o único com uma câmara fotográfica»

«O sentimento de perda de uma boa fotografia não acontece se a fotografia não existir; Isso só acontece quando os nossos parceiros têm a fotografia ou quando o acontecimento está à nossa frente e nós não conseguimos ser suficientemente rápidos para fazer um disparo. Mas quantos acontecimentos acontecem na diagonal da minha nuca e eu não sei o que perdi, e ainda bem, caso contrário seria esmagador e frustrante»

«A dignidade humana está acima de tudo mas eu tenho de mostrar ao mundo o que as pessoas estão a viver, e essa é uma balança, entre outras que tenho dentro de mim, difícil»

«Tenho acompanhamento psicológico, e durante os três meses na Ucrânia, fiz questão de o manter semanalmente»

Dec 29, 202201:15:25
A timidez curiosa que procura o bom, o belo e o verdadeiro das pessoas - Eugénia Costa Quaresma

A timidez curiosa que procura o bom, o belo e o verdadeiro das pessoas - Eugénia Costa Quaresma

Eugénia Costa Quaresma é a primeira leiga e mulher a dirigir a Obra Católica Portuguesa das Migrações, herança com 52 anos, que recebeu com espírito de missão e serviço. Elege a diáspora portuguesa para explicar o quanto ainda se pode fazer entre a espiritualidade e a evangelização, sem esquecer as tradições, mas reconhece a pedagogia que a OCPM persegue para, na sociedade e na Igreja em Portugal, todos terem casa e serem reconhecidos.
Na sua história destaca o contexto dialogante onde cresce, a importância da comunidade paroquial da Amora no seu crescimento e constata que na procura da sua identidade percebeu que antes de ser de uma geografia era de Deus. O olhar que procura o belo, o bom e o verdadeiro das pessoas, em Eugénia Costa Quaresma, é acompanhado de uma timidez curiosa que a leva a procurar sintonias com as pessoas e a dar qualidade ao tempo.

«Vivemos na Europa uma situação dramática e nem sempre temos esta consciência: se não fossem as comunidades migrantes, as igrejas estavam vazias ou fechadas. E é necessário valorizar o potencial evangelizador das comunidades migrantes, não apenas para conservar a cultura e as tradições, mas para lhes dar um novo sentido: existe uma ponte entre a espiritualidade e a evangelização e parece-me que não fazemos ainda essa ligação»

“A identidade é muito forte para os filhos de migrantes. A dada altura a pergunta coloca-se: «de onde tu és?». As pessoas que se relacionam connosco nem sempre nos veem como naturais da terra e perguntam de onde somos, de onde são os teus pais. Em determinada altura percebi que o ser cristã era a minha identidade primeira – primeiro pertenço a Deus e depois a uma geografia»

«A Amora é uma comunidade multicultural que vive a interculturalidade. Aprendemos a conviver, a reconhecer a riqueza das diferenças e onde todos têm um papel e um lugar independentemente do local onde vêm, o que importa é o seu talento. Todos os padres que foram passando pela paróquia ajudaram no construir família, hospitalidade e acolhimento. O que importa é o talento - de onde vem ou a cor da pele são secundários. Não pensava nisso até chegar à OCPM»

«O Natal é para todos, não é só para as crianças como se costuma dizer. Jesus vem para todos e os adultos ainda necessitam mais: precisam de descobri o perdão, a reconciliação, a paz que se constrói em casa. É uma festa cristã, inclusiva para todos, mesmo para os que não acreditam mas aceitam a festa cristã. Falar de justiça porque todos procuramos de justiça, falar de amor porque todos precisamos de amor e ter gestos de doação que promovam o outro».

Dec 22, 202259:48
Os sorrisos das crianças, a cumplicidade dos missionários e as diversas raizes culturais de um povo - Os 12 dias no Uganda do jornalista Henrique Matos

Os sorrisos das crianças, a cumplicidade dos missionários e as diversas raizes culturais de um povo - Os 12 dias no Uganda do jornalista Henrique Matos

Durante 12 dias o jornalista Henrique Matos e o repórter de imagem Tiago Azevedo Mendes estiveram no Uganda, por ocasião da cerimónia de beatificação de Giuseppe Ambrosoli, missionário comboniano, com formação médica, que permaneceu naquele país entre 1956 e 1987, data da sua morte.

Num périplo que os levou de Kampala, Gulu, Kalongo, Kalawat, Matani, Moroto e Jinja, puderam perceber as fragilidades de um país, marcado por diversas raízes étnicas e tribais, dialetos e culturas, onde o povo espera também que os missionários sejam agentes de justiça social.

O cheiro a terra molhada, depois de vários dias de seca, o calor quente e húmido, próprio da linha do Equador, os paladares diferentes marcados por uma agricultura de subsistência, o sorriso de todas as crianças que com deficiências físicas jogam entusiasticamente à bola, dão o contexto ao trabalho de reportagem que não deixa de impactar quem ali se desloca.

«O distanciamento não impede a nossa sensibilidade. Para trazer o que vi para uma realidade europeia, já que não posso trazer os cheiros, tenho a força das imagens, e tenho de construir uma narrativa que ali experimentei. Esse é o objetivo do jornalismo».

«É impactante. Incomoda quando vemos alguém correr a segurar num pau, onde pés não existem, corpos que se arrastam, chutam com o braço em posição de gatas, mas todos formam uma equipa e jogam de igual para igual – não se ridiculariza ou critica. Sentimo-nos pequenos diante deste cenário»

«Encontrei uma população que faz uma vida de subsistência, vive da criação de gado, da agricultura, de pequenas coisas. Em outros países africanos assim acontece, vi isso em Angola e Moçambique – nestes países não é comum ter-se acesso a um vencimento mensal, o grosso da população vive de negócios próprios»

«É interessante perceber como, numa casa onde chegam 30 missionários vindos dos Estados Unidos, Alemanha, Africa, Filipinas, e a forma como se reveem – não é gente estranha. Muitos já trabalharam juntos, em comunidades, em diferentes locais do mundo; alguns não se veem há 20 ou 30 anos mas é muito enriquecedor ver como estes homens partilham uma experiência de missão, amizade e cumplicidade de um passado que têm e um presente que desenvolvem junto das pessoas. Uma cumplicidade maior que se expressa também na dificuldade de trabalhar em países em guerra, com as carências mais diversas, pela perda de missionários colegas de comunidades mortos no exercício da sua missão – não por perseguição à Igreja mas por criminalidade comum - e percebemos como isso cria uma união muito forte entre estes homens».

Dec 15, 202238:40
Da Polónia comunista, à Angola em guerra, e à falta de tempo na Europa: o percurso missionário do padre Andrzej Fecko

Da Polónia comunista, à Angola em guerra, e à falta de tempo na Europa: o percurso missionário do padre Andrzej Fecko

O padre Andrzej Fecko cresceu num dualismo: em casa cresceu junto da sua família cristã, na rua cresceu no contexto socialista que o fez escolher o trabalho e não o estudo. Mas um convite de um amigo para passar férias deu-lhe a conhecer o carisma dos missionários verbitas e nessa altura percebe que este pode ser um caminho para a sua vida.

Em 1981, antes ainda da queda do Muro de Berlim, vai para Angola, onde permanece 32 anos, ajudando a construir infraestruturas de saúde, educação e de pastoral que ajude o povo a encontrar na religião o sentido que a guerra não lhes dava.

Hoje é o padre André, na comunidade do Prior Velho, onde procura ser padre em comunidade e afirmar que a sua missão é construir com outros e não mandar.

A Conferência Episcopal da Polónia concedeu-lhe a medalha de mérito missionário, reconhecendo a sua dedicação e capacidade de construção. O padre Andrzej Fecko acha apenas que fez o que tinha de fazer, «estar com o povo» e ser com eles.

«Eu estava próximo do marxismo-leninismo e por isso fui trabalhar. Não queria ser um intelectual, queria ser um trabalhador, qual como a ideologia nos dizia. Mais tarde tive consciência que viva entre duas realidades. No dia-a-dia, sentíamos que nos devíamos libertar do regime, colocado por Moscovo, e sentimos, mesmo na rua, que havia muitos militares soviéticos. Sentíamos opressão porque fomos obrigados a aprender russo. Queríamos ser livres, mas vivíamos na ideologia que entrava na nossa vida e mente»

«Na Igreja não podemos esquecer a evangelização. O nosso principal trabalho não é construir, mas evangelizar. Fizemos muito com os catequistas; formamos muitos que trabalham e ficam a acompanhar as suas comunidades. Nestas distâncias não há padre mas há catequistas formados para acompanhar. O padre é um só: já passou esta ideia de que o padre é que sabe e manda. Não. Não gosto dessa ideia. Vamos construir juntos»

«Lembro-me de participar num funeral com mais de 10 caixões de pessoas que morreram num ataque, com a mina a cair dentro de um camião. Não conseguimos fazer as orações porque os militares começaram a disparar e nós ficamos deitados no chão. Foram momentos fortes»

«Trabalhei (numa leprosaria) a fazer os curativos, precisava disto. São doentes especiais que não têm capacidade de se mover, alguns sem pernas, cortados por causa do avanço da lepra. Trabalhamos numa casa que até dava medo de trabalhar lá. Surgiu uma oportunidade de contactar com a Cáritas de França e recebemos financiamento para desenvolver um local apropriado»

Dec 14, 202241:39
Margarida Vaz Pinto descobriu a vocação religiosa depois da JMJ Madrid 2011 e hoje sonha uma Igreja «menos de iguais»

Margarida Vaz Pinto descobriu a vocação religiosa depois da JMJ Madrid 2011 e hoje sonha uma Igreja «menos de iguais»

Margarida Vaz Pinto cresceu numa família tradicional católica, com o cuidado pelos outros e o acolhimento muito marcados na sua vida, deixando perguntas em aberto sobre a sua vocação profissional. Participar na JMJ Madrid 2011 confrontou-as com palavras do Papa Bento XVI que a inquietaram e não a largaram mais em Portugal. «Sonhava ser mãe de muitos» e esse sonho não era compatível com a vida religiosa.
Estudar Teologia, em Paris, conduziu-a à desconstrução da tradição cristã em que tinha crescido mas fê-la apropriar-se do sonho de «abrir horizontes» na Igreja em Portugal e trabalhar por comunidades «menos iguais», onde a «diferença tem pouco lugar».
Hoje, na comunidade da Fonte da Prata, é mãe de muitos, procurando que todas as crianças e jovens se sintam amados, valorizados e com perspetivas de futuro, porque afinal, «Deus parte dos nossos sonhos e do que somos» para sermos felizes.

«As jornadas pode ser uma oportunidade para abrir horizontes, para nos abrirmos ao mundo e para acolher cada um na sua diferença. A Igreja em Portugal ainda é de iguais, onde a diferença não tem muito lugar. As JMJ em Portugal pode ser uma grande oportunidade para cada um se abrir e acolher a diferença»

«Eu cheguei a Portugal e, no voltar à vida normal, percebi que estava diferente, que havia uma questão forte que me habitava e tinha de olhar para ela. Ao mesmo tempo, quando regressei das Jornadas e a questão da vocação se tornou presente, trouxe também outra pergunta, porque conheci uma pessoa de quem me fui aproximando e tinha medo de o magoar»

(Na Fonte da Prata) Queremos que se sintam amados, valorizados e com perspetivas de futuro, que sinta que tem um lugar no mundo e na sociedade, que pode sempre ser mais. Cada um tem muito de bom para dar e ajudamos a puxar pelo lado bom que cada um tem»

«Deus parte dos nossos sonhos e do que somos. Este sonho foi-se transformando na minha vida. Hoje o meu sonho não é ser mãe de muitos filhos, mas pôr o meu lado maternal – que é muito forte – ao serviço das crianças, jovens e pessoas que me são confiadas. Não sou mãe de filhos biológicos mas sou mãe de muitos filhos e muitas vezes sinto, por algumas pessoas, o que uma mãe sente por um filho».

Nov 24, 202201:04:19
Afirmar a esperança que todos os dias existe nos Cuidados Paliativos é o trabalho de Cândida Cancelinha

Afirmar a esperança que todos os dias existe nos Cuidados Paliativos é o trabalho de Cândida Cancelinha

Não cresceu com o sonho de ser médica, nem tão pouco pediatra. Já na Faculdade, Cândida Cancelinha pensava nas áreas generalistas e ficava assustada quando pensava na possibilidade de ter de lidar com famílias em sofrimento. Até que estagiou na Pediatria e não conseguiu virar as costas ao impacto do que ali encontrou. Cândida Cancelinha foi em busca de formação no estrangeiro para conseguir a especialização em Cuidados Paliativos e, reconhecendo o muito que ainda falta fazer, é com agrado que olha para o curto percurso feito em Portugal.

Os Cuidados Paliativos são, como indica, uma área de especialização como qualquer outra e a literacia tem de ser o caminho para a apresentar dessa forma, desmistificando ser destinada a idosos que vão falecer em breve.

Nos Cuidados Paliativos Pediátricos, no Hospital Pediátrico de Coimbra, ou nas muitas casas que visita para dar conforto aos seus pacientes no domicílio na região de Coimbra, Cândida Cancelinha é, com a equipa hospitalar, a mão de consola e trata, a resposta empática e verdadeira, dada em corredores que não são escuros ou tristes, mas cheios de vida onde a esperança é todos os dias afirmada.

«Sou defensora que as pessoas têm de saber o que são cuidados paliativos. O caminho tem de ser pela literacia. Há pessoas que tem consciência, sobretudo quem os vivencia na pele. É muito gratificante ver as nossas famílias a participar e dar testemunhos sobre o que são os cuidados paliativos. Mas há ainda um profundo desconhecimento porque fugimos de falar sobre o sofrimento e a morte»

«As crianças não pertencem nem à família nem aos hospitais, mas à sociedade. O nível de desenvolvimento da nossa sociedade mostra-se pelos cuidados que prestamos e oferecemos às nossas crianças. São crianças que têm o direito de ser tratadas enquanto tal e ser incluídas na sociedade onde estão, independentemente de todas as suas necessidades»

«Muitas (crianças) inibem-se de fazer perguntas à frente dos pais porque não os querem preocupar. Mas muitos perguntam: Eu posso morrer? Quantos meninos tiveste que morreram com este medicamento? Eu sei que isto vai acontecer, mas eu não sei quem vai cuidar da minha mãe quando eu morrer? Será que vou ser lembrado? A minha família vai esquecer-se de mim? Vão lembrar-se só do meu irmão? Como foi com outros meninos que tiveram a mesma doença que eu?»

«Há pais que pedem para não falarmos com as crianças, mas esse é um trabalho que tem de ser trabalhado. Pensa-se que crianças de cinco anos não percebem, mas elas percebem o tom de voz, percebem quando os pais saem do quarto para falar e chegam com os olhos molhados. Há um trabalho que precisa ser feito para evitar a conspiração do silêncio».

«A esperança é a base para as famílias enfrentarem cada hora, cada momento difícil. O nosso trabalho é consolidar e alicerçar essa esperança. A esperança é transversal e é ela que nos deve orientar para o futuro em branco. Mesmo quando a vida termina é muito bonito quando as famílias nos visitam, as conversas, os sentimentos que ficam, a forma como conseguem viver a dor de forma consolidada e tranquila, sabendo que fizeram tudo o que foi possível para o seu filho viver o mais feliz possível até ao fim, sem sofrimento. Se houve sofrimento, o nosso trabalho falhou e ainda, infelizmente, há muitas situações de profundo sofrimento».

Nov 18, 202201:01:35
Quando o colocar palavras na história conduz à reconciliação, com Fatu Banora

Quando o colocar palavras na história conduz à reconciliação, com Fatu Banora

Fatu Banora é uma jovem de 22 anos, natural da Guiné-Bissau, que em Portugal encontrou o seu caminho. Aos oito anos deixou para trás a cidade e as tradições muçulmanas em que cresceu para, ao abrigo dos acordos de saúde, tratar de um problema cardíaco. Aqui ficou para poder estudar, tal como seu pai desejava. De uma infância feliz, nas ruas de Bissau, Fatu chegou às ruas de Lisboa, e em Portugal, anos mais tarde viu-se confrontada com o que tinha «fechado num baú» - o impacto e as consequências da mutilação genital feminina. Desde então colocou nomes na sua história, reconciliou-se com um passado que não pode alterar e encontrou o caminho para estar ao serviço da sua comunidade.  Fatu não sabe que nome dar a Deus, mas está certa de que ele conduz a sua vida e coloca no seu caminho pessoas para lhe iluminar os dias. Foi assim com a Associação para o Planeamento Familiar, com a rede internacional que luta contra a mutilação genital feminina, com a Academia de Líderes Ubuntu e com tantos amigos e família que não a largaram quando as palavras ainda não chegavam para compor e aceitar a sua história.  Hoje estuda psicologia e foi a primeira galardoada com o prémio António Brandão de Vasconcelos.

«Eu sou muito do que sou porque tive pessoas comigo. Esta ideia de que somos porque os outros são é uma troca que me fascina»

«As minhas questões começaram na adolescência. Foi das piores fases em termos de propósito e sentido. Confrontei-me com questões que fizeram parte da minha infância e foi nessa altura porque comecei a sentir, na adolescência, o impacto e as consequências da mutilação genital feminina. Na altura eu associava: eu sou muçulmana e na Guiné a comunidade mais afetada pela MGF é a comunidade muçulmana; então se eu não tivesse nascido muçulmana, nada disto teria acontecido. Era uma altura de muitos porquês sem resposta que me levaram a confundir tudo, a culpar quem não tinha culpa e a ter atitudes que não me levavam a lado nenhum, só pioravam»

«Foi uma conversa muito bonita (com o meu pai). Foi a primeira vez que falamos sobre isto. Voltei atrás em toda a história: durante muito tempo coloquei dentro de um baú e fechei, mas mexeu muito comigo durante o meu crescimento, causando muita rebeldia. Tive a capacidade de dizer ao meu pai que não o culpava. Houve momentos em que os culpei, a ele e à minha mãe, mas se fui vítima desta prática os meus pais também foram, e os pais de outras meninas foram e são vítimas porque estão inseridos numa cultura que só lhe mostra aquilo»

«Fui uma privilegiada por ter tido olhares em mim. Sou muito grata por isso. Embora tenha muitas questões sobre a religião, eu acredito muito em Deus. Não sei que nome dar e de que forma praticar, mas acredito muito em Deus e que Ele está presente em todos os momentos da minha vida. Ele põe pessoas no meu caminho que me vão ajudando».

Nov 10, 202257:23
O silêncio, a música, as perguntas e sedes que se procuram em Taizé - irmão David

O silêncio, a música, as perguntas e sedes que se procuram em Taizé - irmão David

O irmão David esteve em Portugal para participar num encontro internacional de preparação da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023, onde a Comunidade ecuménica de Taizé, que integra, vai estar presente, “numa igreja, na baixa de Lisboa”, convidando a fazer o que, indica, a comunidade faz de melhor: “Vamos acolher quem quiser para rezarmos juntos”.

Esse é o convite que semana após semana Taizé renova, confirmando a sua vocação primeira de a todos receber e acolher – não para ver rezar, mas para juntos rezarem.

Nesta conversa o irmão David recorda a surpresa que a oração, simples, silenciosa, feita em comunidade, lhe provocou quando em 1987, foi a Roma participar num encontro europeu. Desde então, o seu caminho, até entrar na comunidade em 1997, foi um atravessar uma porta que se abriu, onde entrou, gostou do que viu, viveu e quis entrar.

A comunidade de Taizé não é imune ao hoje da Igreja: os irmãos enviaram a sua síntese para a secretaria do Sínodo dos Bispos, onde explicaram o seu sonho de ouvir e rezar com que não está na Igreja, e criaram também uma comissão para acompanhar as denúncias de abusos sexuais de menores, que ferem toda a comunidade e que, afirma o irmão David, devem ser assumidos com verdade e transparência, pensando em primeiro lugar nas vítimas.

«Vejo muita vontade de autenticidade nos jovens. Há muitos jovens que hoje vão à Igreja e aquilo não lhes diz nada. Têm perguntas e vão procurar noutro sítio. Querem coisas que sejam autênticas para eles. Acho isso muito bonito. Pode levar a situações muito ligeiras porque as coisas não são sempre preto e branco, mas o desejo de autenticidade fá-los procurar coisas verdadeiras»

«Aquele estilo de oração foi uma descoberta: uma oração cantada, alegre, uma oração em que respiramos; hoje diria, uma oração onde descansamos em Deus. E onde o silêncio marca. Não estamos só para dizer alguma coisa, só para ouvir uma mensagem, mas estamos para estar com, e este estar com, ultrapassa as palavras. E o silêncio é um saber estar sem olhar para o relógio, sem estar a pensar no que vamos responder a seguir, preocupados com o que estamos a fazer, mas estamos porque estamos bem»

«Quando soubemos dos casos, não quisemos fechar os olhos. Queremos em primeiro lugar acompanhar a pessoas que sofrem e em segundo na transparência que é o reconhecimento do sofrimento das pessoas, e fazê-lo publicamente»

«A realidade LGBT é uma realidade que coloca muitas questões, mas antes de colocar as questões, será que nos preocupamos em acolher as pessoas? Em ouvir? O que têm a dizer? O que vivem? Como se sentem excluídas? Para a comunidade de Taizé esta realidade não é teórica. Chegam pessoas com grandes sofrimentos, delas e dos seus familiares, e a pergunta é como são acolhidas e ouvidas?»

Oct 27, 202201:32:56
O caminho da sustentabilidade construído em família, com Rita Nascimento e João Antunes

O caminho da sustentabilidade construído em família, com Rita Nascimento e João Antunes

Rita Nascimento e Joâo Antunes lançaram, durante a pandemia, o projeto «Treethis.com», apostado em reduzir a pegada carbónica, com a plantação de árvores, e a venda de produtos sustentáveis, mas após a sua participação no encontro «Economia de Francisco», em Assis, consolidaram a vontade de, através da educação, criar impacto junto das gerações mais novas. Em casa, junto dos filhos, criaram um plano para se manterem fiéis a comportamentos sustentáveis, procurando preseverar e não vacilar perante campanhas de marketing e asseguram que hoje são os filhos que os puxam para atitudes sustentáveis e amigas do ambiente. No encontro com o Papa Francisco, ratificaram um estilo de vida verdadeiramente sustentável, que junta a atenção social e ambiental ao caminho espiritual que fazem em família.

«Percebemos que podemos ser facilitadores entre escolas, educadores, organizadores, alunos e conseguiríamos ter esse impacto na criação de consciência e mudança de comportamentos, com foco nas novas gerações. As crianças percebem mais do que se pode imaginar. A educação tem de ser mudada: temos de parar de pensar que as crianças não percebem» - Rita

«No início estamos entusiasmados e não nos importamos de gastar mais dinheiro para ter um produto mais sustentável ou gastar mais tempo, mas o difícil foi manter. Os nossos filhos já nos fazem pressão quando percebem que alguma coisa não está certa, seja com o gasto de água, a separação do lixo, o optar por fazer as deslocações a pé ou de carro» - João

«Se for bem construído dentro das organizações terá impacto nas pessoas e no seu funcionamento. As pessoas estão hoje mais despertas e exigem às organizações mudanças. Estamos no momento certo para mudar e para que as organizações vejam as pessoas como recursos positivos para o local onde estão e possam investir numa dimensão fraterna, procurando dar dignidade aos colaboradores» - João

«Todos nos perguntam o que fomos fazer a Assis. As pessoas questionam e temos tido conversas muito interessantes com pessoas católicas e não católicas sobre o que é e o impacto da Economia de Francisco pode ter. O convite explícito do Papa Francisco para cuidarmos da Casa comum, que é o que o cristão deve fazer. Trata-se de viver de facto a sustentabilidade, social e ambiental. Pareciam caminhos paralelos, mas somos um só e a ação está muito ligada ao pensamento e à parte espiritual» - Rita

Oct 13, 202254:34
«Qual foi a minha doação total hoje?» - Irmã Alzira dos Santos

«Qual foi a minha doação total hoje?» - Irmã Alzira dos Santos

Depois de 17 anos a trabalhar numa fábrica de calçado, onde entrou aos 14 anos, a irmã Alzira dos Santos, se confrontou com o que queria fazer da sua vida. Irmã mais velha de nove irmãos, habituada a cuidar dos pais e da família, a irmã Alzira “não tinha tempo para pensar em outras vivências”, de forma natural entendia que a “vida em casal era muito bonita”, mas reconhecia que “sentia não encaixar totalmente”: “Eu só cuidava dos outros e comecei a questionar-me e a rezar”.

A vocação para ser religiosa das Filhas da Caridade de São Vicente de Paulo é hoje confirmada junto da população mais necessitada que recebe no refeitório social, no Campo Grande, onde todos os dias procura, como pedia o fundador, andar nas ruas, “não tendo por mosteiro se não as casas dos doentes, por cela um quarto de aluguer, por capela a igreja da paróquia, por claustro as ruas da cidade, por clausura a obediência, por grade o temor de Deus, por véu a santa modéstia e não fazendo qualquer outra profissão para garantir a própria vocação”.

«As coisas de criança são as que mais recordamos, agora com um olhar diferente, mas há memórias muito boas: ser uma família alargada, uma família unida e de bem. Isso é uma recordação muito presente. Ir para o campo, em Guisande, Santa Maria de Feira, com a mãe, onde, naturalmente se crescia no campo e em casa de vizinhos».

«Da fábrica guardo imagens muito bonitas: aprendi muito em responsabilidade, organização, soube cumprir regras que hoje nos fazem falta na sociedade. Ali me apercebi que a vida de casal era uma beleza. Mas como tinha sempre afazeres – em casa, na fábrica, e a tomar conta dos outros – achava que ali era o meu lugar, nunca tive disponibilidade para pensar em fazer outra experiência».

«Eu pensava muitas vezes que as crianças com deficiência não estavam ali por elas, mas por mim. Se eu não cuidasse delas, elas não viviam, elas estavam lá para a minha santificação, não pela delas, porque elas já estavam santificadas. Uma altura lamentava que não tinha feito a via-sacra na Quaresma e a diretora disse-me: «A Via-sacra tem 14 estações, mas aqui tem 45 quartos». E fiquei sem respostas, mas era a realidade: se eu entrasse em cada quarto com dois residentes era uma via-sacra bem mais difícil».

«O aproximar-se da pessoa pobre implica ir ao carisma de São Vicente, ver Jesus no pobre. Não é fácil com o cansaço do dia-a-dia, mas quando paro e percebo que não fui tão correta, questiono qual foi o princípio hoje do meu dia? Qual foi a minha doação total hoje? Se São Vicente estivesse cá hoje como é que ele trataria as pessoas? Se ele já era tão atualizado no seu tempo, hoje estaria ainda mais».

Sep 29, 202255:55
A procura dos jovens, a solidão dos velhos e o alicerce da fé na vida de Beatriz Roque Antunes

A procura dos jovens, a solidão dos velhos e o alicerce da fé na vida de Beatriz Roque Antunes

O olhar sobre a vida dos jovens, dos idosos que vivem na solidão na cidade de Lisboa, as perguntas que tantos jovens fazem à Igreja e à procura «de Deus» são temas desta conversa com Beatriz Roque Antunes, autora do símbolo das Jornadas Mundiais da Juventude Lisboa 2023. A jovem designer conta como é crescer na procura das respostas da fé entre os corredores da Faculdade de Belas Artes, onde estudou e onde confirmou que na indiferença, há muita procura.

«Sempre fui uma pessoa de perguntas. A minha maneira de viver a fé vem de nunca ter deixado de perguntar e não ter medo de perguntar. Acho que é na dúvida que a fé cresce. E por isso, ao longo da minha vida, fui procurando locais para mais respostas».

«A minha geração vive uma tensão geracional: a dificuldade de partilhar casa, alugar um quarto e viver dessa forma, ou continuar em casa dos pais. É impraticável, um jovem, com um primeiro emprego, suportar uma renda».

«Gostava que a mudança na cidade de Lisboa tivesse privilegiado mais as relações pessoais, e que pudéssemos depender mais uns dos outros. Sempre tive sorte com os meus vizinhos. Mas os bairros são todos muito diferentes, mas todos têm muitos idosos, que sofrem de solidão. Era bom que houvesse do ponto de vista institucional, mais projetos que apoiassem os idosos, com um maior sentido de comunidade».

«A vida está difícil para quem é velho»

«A guerra na Ucrânia, inflação a subir, a necessidade de conceber um novo modelo económico, as alterações climáticas e o que é pedido aos católicos para conceberem uma nova forma de relação económica. Espero que quando toda a juventude estiver reunida com o Papa estejamos atentos ao que ele diz – porque ele não fala por falar – e que isso possa interpelar a nossa oração e ação, e que não seja apenas um encontro»

Sep 22, 202201:05:56
25 anos do programa «A Fé dos Homens» com Paulo Rocha

25 anos do programa «A Fé dos Homens» com Paulo Rocha

No dia 16 de maio de 1997 ficou firmado um acordo com a RTP e 13 confissões religiosas dando origem ao programa «A Fé dos Homens», hoje concretizado também na rádio pública. Paulo Rocha, diretor da Agência Ecclesia que produz os programas da Igreja católica, assinala os 25 anos com o reconhecimento do programa como ator principal na construção de uma cultura de diálogo inter-religioso em Portugal. Este é um projeto nascido entre instituições, mas também entre pessoas, que se reconheciam, respeitavam e dialogavam, que continua a apresentar desafios no espaço público e para a Igreja católica em processo de sinodalidade.

«Independentemente do nome da instituição há o nome de pessoas concretas que fizeram este caminho. Este projeto fala do diálogo que existiu entre pessoas, que se conheceram, se aproximaram e agiram em conjunto, em benefício de todos. É preciso que as pessoas se conheçam, se gostem e se respeitem. Ficaram célebres as sandes de queijo que se comiam, por ser o alimento possível ser partilhado entre todas as religiões nos encontros que se mantinham»

«O ambiente de escuta e sinodalidade foi apelando a uma convergência entre projetos, entre várias dioceses, mas dimensões da presença da Igreja que vão sendo relevantes na sociedade atual - e os meios de comunicação sem dúvida que são - devem ser implicados na definição de projetos que se queiram fazer, de forma transversal, para a Igreja em Portugal»

«Sempre me parece que se um produto é bem feito, tem espaço e é reconhecido. Só depende de nós. O trabalho do jornalismo é de equipa: não é de hierarquia, não de afirmação de poder. Parte do conhecimento e da criatividade do jornalista. Quem coordena a equipa só pode soltar a corda porque isto só lá vai por vontade do próprio».

Sep 15, 202237:13
As moradas onde o padre Miguel Vasconcelos encontra Deus e confirma querer viver «o risco da fé»

As moradas onde o padre Miguel Vasconcelos encontra Deus e confirma querer viver «o risco da fé»

José Augusto Mourão, Sophia de Mello Breyner Andresson, Adélia Prado ou Bob Dylan são algumas moradas onde o padre Miguel Vasconcelos confirma uma intertextualidade existente, locais onde lê Deus. No caminho espiritual que foi fazendo, o estudo da Teologia, deu ao padre Miguel, palavras para dizer Deus, se dizer a si próprio e a realidade que o rodeia, mas, de forma honesta, diz não ter a certeza de ser Deus a falar-lhe. Nesta conversa, o sacerdote ordenado em 2017, recorda as relações que o fizeram querer "viver o risco da fé" e percebe o "tesouro" e a "terra sagrada" que lhe é confiado por ser padre, por ajudar a fazer da Igreja um lugar onde tudo o que de mais profundo uma pessoa é, "possa ser dito, escutado e acolhido".

«As pessoas confiam nos padres, não porque sou eu, mas porque sou padre e isso é uma distinção importante, que me dá serenidade. Essa confiança dá acesso ao que as pessoas são de mais íntimo. Estamos diante de algo precioso, é um tesouro na vida da Igreja: há um lugar para que aquilo que sou de mais profundo possa ser dito, escutado e acolhido. O acesso privilegiado ao coração das pessoas é perigoso porque qualquer passo em falso ou falta de tato, pode ferir e essa vulnerabilidade precisa ser tratada como terra sagrada. E eu preciso de repetir isso todos os dias. Eu sou uma pessoa como as outras, tenho fragilidades, e reconhecer que não estou em meu nome, é fundamental»

«A experiência da fé não tem nada de seguro ou fixo e quando tem, provavelmente estamos a domesticar a experiência do Evangelho. Quando lemos os Evangelhos não há nada que desinstale mais, que tire mais o chão, que nos dê menos conforto. Quando estou muito confortável com a fé, estou mal, estou instalado e precioso do Espírito Santo para desarrumar a casa»

«As nossas palavras são sempre curtas, a nossa capacidade de formular é frágil e contar com dois mil anos de gente à procura das palavras certas e da melhor forma de dizer o mistério que experimentamos, é extraordinário»

«Nós somos todos a mesma coisa, feitos da mesma massa. Sempre que há uma procura honesta da verdade, da beleza e da bondade, eu posso não dar esse nome, mas estou a caminho de Deus. E se Deus me der essa graça, hei-de encontrá-lo e dar-lhe um nome. Se a minha vida de padre poder servir isso, fico muito feliz».

Sep 08, 202258:28
O amor pelas pessoas que conduziu Vanessa Alves à saúde mental e aos cuidados paliativos

O amor pelas pessoas que conduziu Vanessa Alves à saúde mental e aos cuidados paliativos

Vanessa Alves nunca esteve certa de que queria ser enfermeira, mas já lá vão mais de dez anos a confirmar que o seu amor pelas pessoas se evidencia no cuidado e no tempo terapêutico que dedica aos seus pacientes. Despois de vários anos na área de saúde mental, Vanessa Alves é hoje enfermeira em cuidados paliativos, área onde quer dar vida a quem se cruza.

A sua arca do tempo permite-lhe ainda dinamizar o grupo «PCB@LX», onde universitários e jovens trabalhadores oriundos da diocese de Portalegre – Castelo Branco que residem em Lisboa, se reúnem mensalmente, e integrar o Comité Organizador Diocesano de PCB que prepara a Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023.

Nesta conversa descobrimos as marcas do avô Abílio no seu crescimento, a vida em Alcaravela, a localidade que a ajudou a crescer e o seu sonho para a JMJ Lisboa 2023.

O avô Abílio ensinou-me que as pessoas são o mais importante. Que independentemente se havia ou não conversa, o importante era estar. Foi com ele aprendi muitas coisas: atar os sapatos, jogar à bola, andar de mota. Ensinou-me a tabuada, a jogar às cartas, a não fazer batota. Ensinou-me a ser uma pessoa de bem».

«Basta que nos imaginemos na angústia por não poder continuar a ver os filhos crescer, não poder ver o casamento do neto ou fazer a viagem há tanto tempo imaginada. Claro que a nossa mente se vai abaixo. Somos todos, em todas circunstâncias, pessoas altamente vulneráveis e esquecemo-nos disto; fazemo-nos de fortes, sempre. Mas chega uma altura da vida em que a vulnerabilidade se toca com os dedos. Nesta altura é difícil, parece tudo ainda maior e mais difícil. Eu, que gosto tanto de pessoas, quero ajudá-las nesta altura em que é tudo muito maior e mais difícil. Acho que não faço coisas extraordinárias, mas empresto as minhas mãos e a partir daí, só Deus sabe o que acontece»

«A Jornada Mundial da Juventude é sobretudo os encontros que anonimamente vemos acontecer. É muito importante a semana dos eventos centrais, mas o caminho, o que preparamos e a vida que vivemos até lá, é que são importantes».

Aug 25, 202257:28
A busca do reconhecimento de uma identidade e do sentido de pertença que Margarida Bruto da Costa quer levar a todos

A busca do reconhecimento de uma identidade e do sentido de pertença que Margarida Bruto da Costa quer levar a todos

Inocência, espanto, surpresa, poesia, identidade, reconhecimento, pertença, são palavras que conduzem a conversa com Margarida Bruto da Costa, psicóloga, que olha para as pessoas como «templos». O seu percurso profissional beneficiou do «dom», que reconhece ter, de facilmente estabelecer «intimidade» com as pessoas, concretizada na capacidade de escuta e de evidenciar a promessa que cada pessoa é. O percurso da sua vida, «feita de crise em crise», serenou quando se reconheceu e se sentiu pertença, «não a um país ou a uma comunidade», mas a algo maior, que quer também entregar aos outros. Por isso assume que a Igreja, «sendo a família maior que podemos ter», tem de ser lugar de pertença para todos, local onde a palavra «exclusão» não pode entrar.  «Vivemos na solidão as perguntas que fazemos. Se formos à procura, a resposta sai, mas poucas pessoas estão disponíveis porque o caminho é lento. O maior problema é a solidão, o não haver espaço e disponibilidade para este encontro pausado, em que estamos de mãos dadas com o outro e disponíveis para ouvir sem querer dar uma resposta apressada»

«Não acredito numa Igreja onde as pessoas não se podem sentir pertença. A Igreja é a família maior que há e não pode haver local onde não se pode ir. As pessoas excluídas tocam-me muito, talvez por causa da minha história. A exclusão é uma palavra que não me faz sentido. Tudo o que puder fazer para abraçar, escutar, reconhecer, eu farei»

«Eu não pertenço a um país, mas a minha segurança vem de algo maior. Não tem a ver com o sítio, uma cor, o local onde nasci, com a família no sentido estrito. Senti-me parte de uma família mais alargada. A procura da minha identidade e local de pertença, cuja busca me marcou, levou-me a procurar as minhas fontes e identificações, revelou-se um caminho»

«Deus gosta mais de nós quando estamos mais frágeis. Tal como com os nossos filhos, o nosso amor cresce: acolhe e faz avançar. Deus só quer abraçar-me: não quer mais nada, nem que eu faça ou diga coisas».

Aug 18, 202255:60
Os super-heróis de São Tomé e Príncipe que Madalena de Almeida Nogueira foi conhecer

Os super-heróis de São Tomé e Príncipe que Madalena de Almeida Nogueira foi conhecer

A vontade de Madalena de Almeida Nogueira fazer voluntariado em África há muito que a acompanhava e acicatava. Até que conseguir concretizar esse desejo, envolveu-se com o Banco do Bebé, o Banco Alimentar Contra a Fome, a Refood e foi fazer um mestrado ao Brasil, onde percebeu como o valor da vida era diferente em diversas latitudes.

Em janeiro de 2020 rumou a São Tomé e Príncipe para trabalhar com a irmãs Franciscanas, em Guadalupe, e por lá permaneceu durante seis meses. No regresso percebeu que África lhe tinha entrado no sangue e juntamente com duas voluntárias, fundou a associação Kêlê, apostada em ajudar a construir o sonho de esperança e mudança daquele povo que começou a amar.

«A educação e a saúde são os grandes problemas de São Tomé. A saúde pode melhorar com educação, porque o rumo acontece quando mais pessoas formadas houver. O importante é incutir, desde pequenos, que a educação é importante, e isso vai dar-nos um futuro mais promissor»

«As várias pessoas que fomos conhecendo, as histórias de vida, deram-nos a conhecer super-heróis, sejam crianças que não têm pais que tem de tratar dos irmãos, da casa, da roupa e comida, sejam as pessoas mais velhas que nos contam as suas histórias difíceis: em todas as pessoas encontramos super-heróis com vidas desafiantes, mais difíceis, e passaram por cima ou ainda em situações complicadas, mas com sorrisos na cara e a ver tudo de forma positiva»

«O meu sonho para a associação, apesar de só termos um ano, é crescer, dar mais apoio aos jovens que apoiamos e, num futuro, queremos chegar a outros públicos dentro da Roça Agostinho Neto ou de Guadalupe. Sinto que mais do que chegar a outros sítios, é chegar a todas as pessoas onde estamos. Criar um projeto com idosos ou com as mulheres da roça que não têm ocupação durante o dia. Estes pequenos objetivos vão sendo os nossos sonhos»

Aug 11, 202240:51
De uma história «inventada por três crianças», para a conversão à vida religiosa da irmã Marta Couto

De uma história «inventada por três crianças», para a conversão à vida religiosa da irmã Marta Couto

Marta Couto era uma jovem cética que achava que as aparições de Fátima eram uma história inventada por três crianças. Até que um encontro, nos Valinhos, põe em causa toda a lógica em que dizia acreditar e fê-la iniciar um caminho de conversão que a levou à vida consagrada. Hoje é junto das pessoas com deficiência e das suas famílias, junto de quem experimenta o sofrimento, que prossegue o seu caminho procurando crescer com a simplicidade, genuinidade e no cuidar dos outros.

«Sou uma pessoa muito lógica e Deus não tinha lógica para mim porque eu pensava como poderia existir Deus e o sofrimento. Para mim, Fátima era uma mera invenção de três crianças que não tinham nada para fazer numa tarde e decidiram contar que Nossa Senhora lhes apareceu. Mas um jovem falou-me, nos Valinhos, das aparições do Anjo, e das orações: como é que três crianças analfabetas poderiam inventar tais orações? Isso mexeu muito comigo. Meteu toda a minha lógica em crise. Foi a partir daí que se deu um grande movimento interior de conversão e me fez entrar no Movimento Mensagem de Fátima (MMF)»

«Na casa dos Silenciosos Operários da Cruz deparei-me com uma realidade muito diferente do sofrimento, porque sempre fui tendo esta questão: «Se Deus é bom porque sofremos, porque existe o sofrimento no mundo»? O MMF foi-me explicando teoricamente o sofrimento, e a noção da importância de oferecer o sofrimento, mas ao chegar a estas semanas, ver os pais e jovens, ver esta comunidade dos Silenciosos e a forma como encaram e ajudam a encarar o sofrimento, não como uma condenação mas como um caminho que pode ser feito para nos ajudar e transformar para algo mais, apercebi-me que o cuidar do outro, ajudar e acompanhar era algo que eu queria fazer com a minha vida»

«O sofrimento das famílias mostra-se na solidão que vivem, sentem-se únicas na situação que vivem e não encontram empatia no seu dia-a-dia. O amor que sentem pelos seus filhos é algo transcendente. Sem esse amor, não seria possível continuar. Elas são especialistas em amor».

Jul 28, 202254:37
Ser médica junto de quem está fora do sistema é prioridade de Alexandra Fernandes

Ser médica junto de quem está fora do sistema é prioridade de Alexandra Fernandes

39 mil utentes no concelho do Seixal sem médico de família levaram Alexandra Fernandes a mudar de vida. Deixou o seu emprego estável e os pacientes que acompanhava há 25 anos, para «combater a injustiça» junto daqueles que chama os seus «prediletos» - as pessoas fora do sistema. Nesta conversa ficamos a conhecer a formação cristã que os pais não crentes lhe quiseram dar, o exemplo de igualdade com que cresceu em casa, o projeto de financiamento internacional que criou com a herança do seu pai, e a escada do filme «Indiana Jones» que sempre encontra na sua vida quando sente os seus passos vacilar.

“Sempre tive mais vocação para combater a injustiça do que para aliviar o sofrimento, mas há muita injustiça no não alívio do sofrimento. Eu gosto muito de pessoas, de estar com pessoas, e gosto muito de fazer várias áreas da medicina. Prevenir a doença, tratar pessoas doentes, acompanhá-las ao longo da sua vida, tratar pessoas no final da vida. Eu acompanho as pessoas desde que elas são um desejo dos pais”, valoriza.

«Acompanho pessoas até à morte e quase sempre fui ao velório das pessoas, cumprimentar a família. É uma relação íntima e familiar. É-nos dado entrar em espaços sagrados da intimidade familiar. Acho isso muito interessante».

«A primeira coisa que vou perguntar a Deus quando o encontrar diretamente, é sobre o sofrimento causado, em especial as doenças de crianças. As doenças que causam sofrimento é um mistério que não consigo resolver. Dá ideia de que Deus podia ter sido mais perfeito, nos meus critérios. Tenho dúvidas sobre normas e dogmas da Igreja, mas não me distancio porque aquilo em que eu tenho a certeza que acredito, já me dava para duas vidas».

«A magnitude do mal parece quase impossível de combater. Parece que não aprendemos, que não evoluímos, e eu parece que me esgoto quando olho para isso. O que penso é que contra a totalidade do mal, com maiúscula, o bem, com maiúscula, que é Deus. É preciso fazer a nossa parte. Temos de descobrir a nossa parte e fazê-la».

Jul 21, 202201:03:51
Quando a vida das crianças se torna a missão pessoal e profissional de Ana Sofia Marques

Quando a vida das crianças se torna a missão pessoal e profissional de Ana Sofia Marques

Ana Sofia Marques assume a importância das crianças na sua vida. Foi a experiência de voluntariado numa casa de acolhimento que a fez perceber que a sua missão pessoal e profissional, podiam estar sintonizadas. Já deu colo a muitas crianças e quando percebeu que já não podia levar para casa mais histórias de trajetos difíceis, deixou que o projeto «Amigos p'ra vida» pudesse contagiar outros para criar relação com crianças que precisam de colo, mas que precisam também que outras famílias deem colo aos seus pais, irmãos, avós...

«Quando acabei o curso, todos os meus colegas e amigos foram para sociedades de advogados e eu fui bater à porta de várias IPSS e tentar perceber o que fazia sentido um jurista fazer, porque não era claro que alguém da área do Direito pudesse trabalhar numa IPSS. E eu acreditava que havia de encontrar uma forma de conjugar o direito com a proteção de menores»;

«A minha vida está cheia de crianças, às vezes pergunto-me se serão demais, mas acredito que não porque aos meus vão-se acrescentando outros que estão próximos porque sinto a missão de cuidar de alguns, mas ter consciência que não conseguimos cuidar de todos. Compete à sociedade cuidar. E podemos ajudar outros a cuidar e sensibilizar e cativar outros para a missão de cuidar»;

A história da minha fé está relacionada com a Candeia. Os meus pais não são praticantes e, eu e a minha irmã não fomos batizadas. Sempre estive próxima de irmãs, de padres, tenho padres muito amigos, e agora que sou crente, uma crente tardia porque me batizei com 33 anos, fiz o processo de conversão em adulta, olho para trás e vejo Deus nesse percurso: esteve sempre lá e Deus deu-me o meu tempo. Nunca me senti a chegar tarde. Fui vivendo uma vida de aproximação e eu não conseguia que fosse de outra forma».

Jul 14, 202201:12:60
Os cruzamentos entre a enfermagem e o ser Igreja de João Paulo Nunes

Os cruzamentos entre a enfermagem e o ser Igreja de João Paulo Nunes

Enfermeiro especialista na área infantil e pediátrica, João Paulo Nunes divide a sua vocação entre a formação a futuros profissionais e a prestação de cuidados de saúde em realidades diferenciadas. Foi essa missão que o levou a Angola onde, num projeto da Fundação Fé e Cooperação, ajudou a demonstrar como a mortalidade materna e o neonatal pode ser reduzida com poucos recursos económicos. Em África conheceu pessoas que vivem "muito próximo da essencialidade da vida" e confirmou como a proximidade é fundamental nos cuidados de saúde, tal como o é em todas as concretizações das obras de misericórdia, independentemente do seu contexto.

“A Igreja é composta por cristãos, uns são enfermeiros, assistentes sociais, jornalistas, e todos temos a obrigação de alimentar os famintos, mesmo que alimentar os famintos signifique uma coisa para os enfermeiros e outra para os jornalistas, mas o paradigma é comum";

"Ensinar a saber, ensinar a saber fazer e esperar que as pessoas sejam, no sentido ético da palavra, pessoas íntegras, autênticas, pessoas que têm um projeto de vida na qual a enfermagem lhes dá o caminho para serem quem querem ser";

"Estão identificadas, a nível internacional, as causas da mortalidade materna – a hemorragia pós-parto e a infeção puerperal, que acontece após o parto. Sabendo as duas grandes causas que são a origem de mais de 70% das mortes, é evidente que se olharmos para elas de forma preventiva, acutilante, determinada e em grupo, a probabilidade é diminuir e foi isso que fizemos";

"Muitos milhares de crianças morrem no primeiro mês de vida, muitas nos primeiros sete dias de vida, e ainda mais no primeiro dia de vida. Esta lógica estatística faz-nos perceber que se incidirmos a vigilância nos primeiros dias de pós-parto, estamos a prevenir a morta daquelas crianças”.

Jun 30, 202256:39
A história dos irmãos Afonso e Pedro Sousa que os levou à ordenação sacerdotal

A história dos irmãos Afonso e Pedro Sousa que os levou à ordenação sacerdotal

Afonso e Pedro Sousa são irmãos gémeos, vão ser ordenados padres no dia 3 de julho, no Mosteiro dos Jerónimo, em Lisboa, depois de um percurso, de quase 10 anos de formação no Patriarcado de Lisboa. Nesta conversa evocam momentos familiares que dão conta do seu crescimento e conhecimento em Igreja, caminho que os levou a querer entrar no Seminário quando ouviram o convite «A Igreja chama-te ao seminário». Esta é a história que hoje entendem que Jesus fez com cada um, fruto do que conheceram em casa, do que aprenderam a amar, depois de conhecerem o mundo e do desejo afirmado de querem ser padres para a igreja.

“Tivemos muita conversa à mesa sobre a ida do Pedro para o seminário. Os pais diziam que com 14 anos havia ainda muito a viver, manifestando também a preocupação de haver muito a educar”, recorda Afonso Sousa;

“Sempre gostámos muito de brincar, mas levávamos a sério as brincadeiras – se é para fazer, faz-se bem. Fazíamos arranjos de flores e, tendo um pai ligado à parte técnica do som, nas nossas missas nunca faltava um microfone. Apostávamos e gastávamos muito tempo a preparar. Lembro-me que, em maio, fizemos um andor para a Nossa Senhora, com uma caixa de fruta virada ao contrário com uns pauzinhos para carregar”, explica Pedro Sousa;

"Nascemos numa família cristã, e sabemos que a família é a base para a construção da nossa Igreja doméstica. Ali temos a primeira Igreja. Eu e o Pedro aprendemos a rezar com os pais. As primeiras experiências de vida na Igreja, participar nas dinâmicas das Equipas de Nossa Senhora, onde os pais participavam, o ir à missa, o rezar à Nossa Senhora em família, as procissões do Corpo de Deus ou a procissão do Congresso da Nova Evangelização nas ruas de Lisboa, são experiências que nos marcam, são semente que os pais deixam que, na resposta ao Seminário, recordamos”, afirma Afonso Sousa;

“O facto de os padres não poderem casar equivale à graça de poder viver como Jesus, com amor que é para todos. É decisivo falar sobre isto porque é relacional e constrói-nos como pessoas; não podemos dizer que o padre perdeu a sua afetividade – ganhou-a de outra forma. Renunciamos a uma relação conjugal para nos entregarmos com disponibilidade à Igreja. Esta renúncia não é só um «não»; eu renuncio, mas digo «sim» a outras coisas”, acrescenta Pedro.

Jun 23, 202252:58
Entregar, confiar, amar e sorrir - os verbos conjugados diariamente por Carlota Paupério Silva

Entregar, confiar, amar e sorrir - os verbos conjugados diariamente por Carlota Paupério Silva

O sorriso de Carlota Paupério Silva ensina que tudo o que se vive na vida é caminho: das fraquezas faz forças e do pouco multiplica em momentos de simplicidade e alegria. Fisioterapeuta de vocação e profissão, Carlota é também mãe de seis filhos, «uma já no céu», que veio com uma missão de ensinar a família a confiar e a entregar. Diariamente assume um «sim» com o marido José, para juntos continuarem um caminho iniciado quando se conheceram num campo de férias em Rabo de Peixe.

«Desde pequena que lido com a morte num sentido muito próximo e real. A vida eterna para mim é muito real. Não tenho memória do meu pai, tenho mais memórias construídas com histórias que me contam, mas o meu pai sempre esteve presente, há uma relação para além das fotografias. Isto fez-me perceber o quão importante é o presente. É bom sonhar e projetar o futuro, mas há coisas que têm de ser vividas agora»;

«Há muita gente que tem problemas com a Igreja fruto de maus encontros, mas quando isso acontece podemos ir à procura de outro lugar. Se a comunidade, onde moramos não nos é casa – porque é casa para outros - tem a ver com linguagem, com forma de estar até com a fase da vida em que estamos e com o que precisamos, podemos sempre ir à procura de outros encontros»;

«Quando conheci o José estava em discernimento vocacional. É um tabu muito grande. A sociedade tem um calendário social. O discernimento devia ser obrigatório principalmente para quem casa, porque o matrimónio deve ser uma vocação, não um passo social. Quando o José chegou à minha vida achei que era um grande amigo, e achei ótimo, e só depois quando me percebi apaixonada, percebi que o caminho já seria outro, porque não vi um apoio mas um companheiro de caminho»;

«Os filhos não são nossos, são-nos emprestados, confiados, e é-nos pedido para os acompanhar na sua missão, não na nossa, nós temos outra. Ainda não descobri qual a sua missão no mundo – a sua vida ainda está a acontecer – mas já descobri algumas missões deles comigo. A Graça veio dar-nos missão também. Ensinar-nos a confiar, e a pedir o dom da confiança, da entrega, de perceber que até podemos não perceber porque é que ela morreu, mas podemos transformar a pergunta num 'para quê?' e perguntar à Graça e ir descobrindo esta resposta».

Jun 16, 202201:32:07